quarta-feira, 28 de maio de 2008

Carta para um divorciante

Buenos Aires, 28 de maio de 2008.

Prezado Divorciante,

Pretendia escrever uma carta, ou melhor, um billhete para outra pessoa, para explicar que ando um pouco ausente por motivos de força maior... Motivos “capitalísticos”. Não podia desaproveitar a chance de pagar parte das dívidas fazendo uma boa tradução. O desagradável era o assunto, muito mais do que o cansaço na cabeça, nos dedos e no peito (quem me mandou ter uma péssima postura enquanto digito?) que a tradução gerou.

Mas resolvi escrever para você, agora que vi na televisão um dos motivos para o divórcio aqui na Argentina. Um dos motivos é a falta de amor. Isso mesmo, a falta de amor, e nada mais. Antes, era necessário um “culpado” e uma “vítima” para ser apresentado ao juiz na hora do divórcio. Eta mundo maniqueísta! É claro que existem casamentos ou relações que terminam por causa do comportamento, das atitudes, de uma das pessoas. Agora, esperar que todo final de relação tenha um culpado e uma vítima é negar que às vezes o culpado também é vítima e a vítima também é culpada.

Mas, claro. Que prático é dizer: - A culpa é sua! Eu sou um santo/a! Se bem que muitas pessoas acabam dizendo aquela frase tão verdadeira quanto as boas intenções de um deputado que foi eleito comprando votos: - O problema não é você, sou eu. Você é um/a santo/a, mas eu é que não estou bem.

Isso me leva a pensar que mesmo que a falta de amor seja agora motivo para divórcio, poucos terão culhão ou ovário suficiente para dizer ao parceiro: - Olha, você é uma pessoa legal, mas o amor entre nós acabou. Ou: - Olha, descobri que você não é a pessoa que eu sonhava, que eu fantasiava, que eu queria que fosse, e o amor se perdeu em algum ralo. Ou ainda: - Olha, acho você uma merda, e o amor que eu tinha por você era pouco e se acabou.

Definitivamente, acho que serão poucas as pessoas que farão isso. As pessoas continuarão traindo os seus parceiros, continuarão minando suas relações com palavras ásperas, com atitudes grosseiras, com falsas promessas, e na hora do divórcio continuarão preferindo o papel de vítima, com olhos de sofrimento e atuações, muitas vezes, dignas de um Oscar.

Mas não sou psicólogo, não sou advogado, não sou sexólogo. Sou apenas alguém que viu uma reportagem, e fez um intervalo porque a tradução estava me sufocando. Ou me afogando (em merda), já que o assunto da mesma é "água e esgoto".

Bem, fico por aqui. Tenho que continuar trabalhando.

Um abraço,

I.R.