sábado, 28 de fevereiro de 2009

Árvore Genealógica

Era uma vez um casal armênio que não nasceu na armênia. Eram gregos. Quer dizer, ela era grega e ele também, mas nascido numa cidade que depois de seu nascimento tornou-se turca. Para os gregos, ele era turco. Conheceram-se, casaram-se. Tiveram uma filha na Grécia. Mas saíram de lá depois da segunda guerra. Foram para a então Iugoslávia. Mais uma filha. Em busca de uma vida melhor foram para o Brasil. Mais uma filha. Próxima parada, a Argentina. Agora não veio mais uma filha. Nasceu o único menino.

Esse menino de sangue armênio cresceu e fez parte da viagem dos pais ao contrário. Não foi muito longe, parou no Brasil onde conheceu sua mulher, filha de um espanhol com uma mineira. Mineira dessas misturadas do Brasil, cuja família só reconhece algum antepassado índio.

O casal teve três filhas. A mais velha, depois de um casamento fracassado no Brasil, com um paulistano filho de gaúcho com baiana, resolve retomar a viagem dos avós ao ponto final. A Argentina. Disposta a conhecer algum argentino interessante, bonito, gostoso, ela acaba se deparando com um carioca franzino, mas nem por isso nem um pouco interessante ou gostoso.

Carioca. Maneira de dizer.

Era uma vez um holandês que se casou com uma francesa e tiveram uma filha brasileira, branca dos olhos bem azuis. Essa mesma branca se casou com um mulato e tiveram vários filhos, entre eles um com cara e pinta de galã, sedutor e que de farda devia realmente arrasar muitos corações. Esse jovem galã foi casado por uns 50 anos, mas antes desse longo, houve outro de uns 11 anos. Há “erros” pelos quais devemos agradecer sempre.

Desse de 11 anos, foram três, do de 50 mais dois. Dos três primeiros, o primeiro homem, carioca, conheceu uma paraense. Era uma vez um português que conheceu uma índia. Casaram-se, tiveram vários filhos e uma delas se casou com um homem de quem não conheço muito bem os detalhes da origem. Tiveram uma filha, a paraense que se casou com o carioca.

O primogênito foi um também carioca criado no interior que quando cresceu resolveu seguir o mesmo curso daquele casal armênio do começo desta história. Foi para Buenos Aires, casar-se com uma portenha filha de uma jujeña (que era filha de um homem da Sardenha com uma mulher de Jujuy mesmo) com um cordobês.

Mas assim como o casamento da portenha com o paulistano fracassou, também não deu certo o do carioca com a portenha. E quis o destino, os deuses, o acaso, a força das marés ou seja lá o que for que carioca e portenha-brasileira-armênia se encontrassem.
E juntos, aqui, ainda em Buenos Aires, produzissem meio sem querer alguém que se tornou mais uma peça nesse emaranhado de nacionalidades, de credos, de desejos, de vontades, de ânsia, no fundo, de apenas uma coisa... Ser feliz.

I.R.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Cordas um pouco mais íntimas

uma é muitíssimo pouco
duas também
três não dá pro gasto
quatro é pouco
cinco também
seis é bom
e sete... ah, sete é demais!

Yamandu Costa



Raphael Rabello



Dino 7 Cordas e Companhia (e que companhia!)



I.R.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Carta para o Império Serrano

Buenos Aires, 25 de fevereiro de 2009.

Querido Império Serrano,

Antes de mais nada, e como já é um costume em minhas cartas, quero explicar o que me leva a escrever para você. Escrevo, amigo Império, para declarar a minha solidariedade no dia de hoje.

Ainda não sou um entendido em segunda divisão. Minha estreia vai acontecer em alguns meses, mas mesmo não sabendo o que se sente estando lá, sei que é duro chegar. No caso que me toca, o do Vasco, você sabe que a segunda divisão foi o merecido castigo por uma péssima política que governou o time da caravela por tantos anos. Mas no seu, amigo Império, foi covardia.

Não vi todas as escolas. Simplesmente não aguento ficar acordado, e mesmo se aguentasse não poderia. Aqui não é feriado, nem informalmente como no Brasil, e em todos os dias seguintes eu tinha de acordar cedo para trabalhar. Mas apesar de não ter visto todas, vi algumas, e te vi, Império.

E vi como a sua história mais uma vez a mostrou grande na Avenida. Você estava alegre, cheia de vida, levantando a Marquês de Sapucaí. Foi um desfile bonito, simples, carregado de energia e emoção. Um desfile digno de um carnaval em tempos de crise.

Mas não bastou. Foi pouco, ao menos para os jurados. Parece que os julgadores do carnaval seguem a máxima de Joãosinho Trinta: “O povo gosta de luxo, quem gosta de miséria é intelectual”, e não quiseram ver o seu Luxo, Império Serrano. E o seu Luxo foi o esse mesmo povo cantando o seu samba-enredo, foi a sua bateria dar um show de musicalidade, foi a sua garra de fazer um trabalho lindo numa época de vacas magras.
Não tem nada, não. Você, e nós também, saberemos dar a volta por cima. E ninguém tira os seus 9 títulos, e ninguém se esquece de “Lendas das Sereias, Mistérios do Mar”, nem de “Aquarela Brasileira”, nem de “Cinco Bailes na História do Rio” ou “Heróis da Liberdade”, “Exaltação a Tiradentes” e muito menos “Bum Bum Paticumbum Prugurundum”.

Império Serrano, você não só é parte da história do carnaval. Você é carnaval.

Agora, frente à cegueira dos julgadores do carnaval deste ano (e procurando voltar ao lugar de onde não deveríamos ter saído), apenas nos resta cantar... Reconhece a queda e não desanima. Levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima.

Um abraço do mangueirense,

I.R.

PS: Não gosto de multidão. Não gosto de suar no meio da multidão. Não gosto dos excessos desses quatro ou cinco ou sete dias de folialoucura. Mas daqui desses muitos quilômetros de distância, só me resta assumir a minha verdade. Sinto saudade do carnaval. Gosto de batucada, gosto de samba, acho que o axé pode ser muito divertido, mas em excesso me cansa. E o funk? Ah, o que seria do carnaval atual sem certas pérolas do funk?

PS2: Ao Salgueiro, meus parabéns!

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Cinzas de Ano Novo!

Hoje é quarta-feira de cinzas. No Brasil, 2009 começa amanhã.

A todos os brasileiros, feliz ano novo!

I.R.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Certas coisas

Nem sempre é questão de necessidade. Às vezes é somente por puro gosto.

I.R.

domingo, 22 de fevereiro de 2009

Rosário

Um terço pendurado em teu pescoço,
Jesus crucificado entre teus seios,
E te devoro, livre de receios,
Meus olhos, minha cara de bom moço.

Tua blusa mostra o umbigo, quase um poço,
E em ti quero grudar por tantos meios,
Pra sermos um umbigo em mil passeios,
Mas nada eterno, apenas um esboço.

Eterno, o terço, apenas e suas contas
E o delírio dos céus se tu me montas
Me deixando sem ar, meio cansado.

Bem acordado sonho com teus peitos,
Deles eu quero a glória dos eleitos,
Quero ser entre os dois crucificado.

I.R.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Uma palavra

Os dedos já não correm sobre o papel. Já não há papel e os dedos, cansados, doloridos, trêmulos, já não conseguem segurar uma caneta. A modernidade o atinge. Seus delírios, antes regados à LSD agora cabem num LCD de 15 ou 14 polegadas.
O vinho acompanha seus pensamentos. O calor abafado e a umidade o deixam pegajoso. Os dedos digitam, não correm mais sobre o papel, mas nada disso o atinge e muito menos o faz se confessar. E haveria tanto para dizer...

São tantos os pensamentos esquecidos e escondidos. Os esquecidos já não incomodam, os escondidos fingem que não estão ou que não existem. Seu cachorro late para um carro que acaba de passar. Na televisão anunciam que o dólar voltou a subir, que o desemprego voltou a aumentar e se lembra de que a última vez que viu uma notícia boa no noticiário foi há alguns meses.

O copo está quase vazio. Toma vinho em copo. Comete essa heresia. Espera o momento da confissão, talvez apenas para si mesmo, já que sabe que de sua boca não sairá palavra. O corpo está quase vazio e os dedos já não correm sobre o papel. A modernidade o atinge, mas não sabe se tem tempo para tanta novidade.

O vinho e o calor não o deixam pensar claramente. O cachorro já não late. Sua mulher e seus filhos dormem. E as palavras que não saem de sua boca nem correm pelo papel estão a ponto de sufocá-lo. Numa tentativa desesperada de respirar, cospe. Cospe uma palavra, mas é só uma. A palavra sai tinta como o vinho. Não é uma confissão nem uma notícia do jornal. Do lado de fora a vida continua passando. O copo está cheio novamente e o corpo continua vazio.

A palavra cuspida, agora impressa no LCD não pede licença, mas também quer um copo de vinho para assim brindarem juntos.

I.R.

Décimo-sexto bilhete para um world músico

Buenos Aires, 20 de fevereiro de 2009

Prezado,

disse-nos uma vez Chico César, também por meio de Daniela Mercury, "quando ouvi Salif Keita dancei". Eu imagino que você, como world músico, já tenha dançado ao som dele. Mas para a maioria de nós, Keita é um ilustre desconhecido. Por isso, meu amigo, espero que outras pessoas além de você, Chico César e Daniela Mercury possam dançar ao som de Salif Keita.



Um abraço,

I.R.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Buenos Aires 40 graus

a umidade aumenta a sensação,
o obelisco parece derreter.
estou em casa,
aproveito os últimos momentos de ar-condicionado
tenho que sair.
a umidade aumenta a sensação,
o cérebro parece derreter.
falta praia.
o chimarrão dá lugar ao sorvete.
a umidade aumenta a sensação,
o vento não existe, já derreteu.

I.R.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Bilhete para um ser vingativo

Buenos Aires, 18 de fevereiro de 2009

Prezado Vingativo/a,

acho que seus anseios não estão com nada. O que você deseja para os outros volta para você em forma de energia negativa. Então, amigo, pense positivo, não deseje o mal às pessoas.

Não estou falando de religião; não estou falando do fim do olho por olho, dente por dente; não estou falando de amar os inimigos. Estou falando de você não se contaminar com o próprio veneno. Estou falando de qualidade de vida.

Agora, devo dar o braço a torcer. O seu hino é realmente nota 10!

Com uma cerveja e umas batatinhas fritas até vale a pena cantar um pouco à vingança.



Um abraço,

I.R.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Carta para Edmar Moreira

Buenos Aires 17 de fevereiro de 2009.

Pouco prezado ainda deputado Edmar Moreira,

Não me interessa saber da sua vida, se você (não pretendo chamá-lo de Vossa Excelência) está bem ou como vai a sua família. Escrevo apenas para tecer alguns comentários.

Primeiro, tenho pena de seus mais de 90 mil eleitores. Mas mais pena tenho de um país que tem 93.360 mil habitantes que acreditem em alguma proposta sua e o elejam deputado.

Ex-PM truculento, empresário sonegador, homem de falcatruas, maracutaias. E deputado.

Você quase foi o Corregedor da Câmara dos Deputados, isto é, o responsável pela apuração de conduta incompatível com o decoro parlamentar. Você!? Para tudo! Um homem que não repassava a contribuição social dos seus funcionários, um homem que tinha um castelo de estilo medieval no interior de Minas Gerais?(construído com que dinheiro?)

Não, Edmar, não dava para você ser corregedor. A sua conduta é incompatível com o decoro parlamentar. E o que você iria fazer? Apurar a sua própria conduta?
E esse castelo? Para mim, os castelos se tornaram museus, hotéis e alguns, claro, continuam sendo residências, mas lá na Europa. Aqui na América do Sul, os castelos aparecem nos contos de fada, nos desenhos animados. Os castelos de verdade aqui no lado de baixo do Equador são uma ostentação de riqueza quase sempre erguida com dinheiro ilícito.

Para mim, os castelos estão ligados às princesas. Mas você, Edmar Moreira, não passa de um sapo que não se tornará um príncipe nem com todos os beijos do mundo.
Sai o dono do castelo, entra O Herdeiro. Sinceramente, não sei quem é pior, se você ou seu substituto. ACM Neto como corregedor, analisando o decoro dos colegas? Para tudo! Ou todo mundo já esqueceu o discurso dele na Câmara dizendo que ia dar uma surra no Lula.

Bem, seu Edmar, são comentários, apenas comentários. Já não tenho o poder do voto para renovar a Câmara. Só voto para presidente e estou de acordo com ele. “São 300 picaretas com anel de doutor”.

E aproveite seu mandato. Espero que o novo corregedor tenha ao menos a decência de investigá-lo e descobrir a origem dos 25 milhões de reais do seu castelo e que o seu mandato seja breve. E sem volta.

Cordialmente,

I.R.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Cordas íntimas

São as cordas musicais que estão mais próximas de nós. Muitos as têm, muitos as tocam, muitos fazem dela uma arma de sedução ou um acompanhamento indispensável em reuniões, luaus, saraus e festinhas informais.

Talvez seja o instrumento mais popular do Brasil. E ainda por cima com um nome no aumentativo, bem ao gosto do brasileiro. Violão.

Pensei muito em quem colocar aqui no Carta e Verso mostrando a sua arte. São tantos e tão bons os que tocam e tocaram esse instrumento que, com certeza, a chance de ser injusto é imensa. Então optei pelos vivos e que tocassem o violão comum de 6 cordas. E depois de optar pelos vivos, o critério foi: eu gosto. E ponto.

Paco de Lucía



Luis Salinas



E João Gilberto, como prova de que sempre há algo novo para se descobrir no instrumento, como exemplo de como muitas vezes o violão é o melhor amigo do cantor.



I.R.

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Desintegração capital

em Bogotá

morava com Santiago da Assunção.

ele gostava de laranja Lima

e eu de limão,

mas esse não era um problema.

o que me incomodava era

que ao seu lado eu não tinha La Paz.

um dia lhe disse "eu me desQuito",

você é um sujo cheio de Caracas.

e parti em minha Brasília,

rumo a novos Buenos Aires

para a cidade de Montevidéu.

I.R.

sábado, 14 de fevereiro de 2009

Dúvida(s)

A angústia de não saber se deve ou não ligar o ar condicionado lhe incomoda mais do que a dúvida se deve ou não mudar de emprego. Uma vida de dúvidas e incertezas.

Casar ou não casar? Assumir aquele filho da ex-namorada que nem mesmo sabia se devia ter namorado?

Que sapato, o preto ou o marrom? A dúvida de se a gola polo ou a gola careca é melhor. A incerteza de se jogar na loto ou na sena.

Mas nada disso o intimida. Nada o impede de viver.

Senhor, carne ou massa? Vamos ao cinema? Vamos. Mas quem sabe o teatro? Não, cinema. Drama, romance, comédia, ação ou pornô?

Cerveja, vinho ou licor. Decisão não tão difícil. Mas decisão, enfim. A vida é possível.

Calor, muito calor. A decisão não lhe cabe, não lhe compete. Faz calor. Não há dinheiro para ir ao inverno do hemisfério norte. Calor e ponto.

Ventilador de teto ou ar condicionado?

Uni, duni, tê... ar condicionado.

E agora, ligar ou não ligar? Que angústia!

Talvez o suicídio seja a solução. Mas um problema... cabeça no forno com gás ligado ou pulo do 8° andar?

I.R.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Na passarela

a fome da modelo
não é sinal de desigualdade
não é fruto da necessidade
é fome de fama.

a fama da magreza dela
não é modelo de saúde
não é modelo de beleza
mas lhe dá fama
e lhe faz modelo,
lhe torna molde
das e para
as futuras famintas

I.R.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Vinda e ida

não vim do macaco
da mesma maneira que
não vim do barro.
não conheço adão,
e eva, junto com vovó e a uva
são palavras soltas na cartilha.
não sei de onde vim
não me interessa saber de onde vim
nem para que estou
nem qual é meu papel,
minha função,
meu destino.
mas sei para onde vou
tenho certeza do lugar para onde vou.
vou dormir,
pois já são duas horas da manhã.

I.R.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Bilhete para a Ise

Buenos Aires, 11 de fevereiro de 2009

Prezada,

algumas músicas são bonitas. Os anos passam, os cantores se sucedem, mas elas não envelhecem. Tá certo que algumas versões não estão à altura delas. Mas essa é apenas a opinião de alguém que curte de Caetano a Odair, de Bezerra a Magal, de Carmen a Marisa... No exemplo abaixo a minha dúvida é outra. De qual eu gosto mais?



e/ou



Gosto das duas. Por que sempre temos que decidir ou isto ou aquilo?

Um abraço,

I.R.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

PS para Carmen Miranda

Se fosse viva, Carmen Miranda estaria fazendo hoje 100 anos e 1 dia de vida. (O que não é pouco.) À sua memória, parabéns!



I.R.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Bilhete para um carnavalesco

Buenos Aires, 9 de fevereiro de 2009

Prezado,

faltam duas semanas para o seu momento. Você deve estar nervoso, eu imagino. Aqui em Buenos Aires já é carnaval. Como não é feriado (já sei que aí também não, apesar de todo mundo viver como se fosse), as murgas saem todos os fins de semana deste mês, e em Gualeguaychú, onde existe um carnaval similar ao do Rio em versão cidade do interior do Brasil, as comparsas também saem todos os fin de semana.

Sabe, esse tempo pré-momo me fez lembrar de uma coisa... do tempo em que se podia falar de Alá sem correr o risco de ser condenado à morte. Bons tempos. Mas aí você vê como a moral depende de quem a determina. Falar de Jesus no carnaval não pode porque o catolicismo tem piti, mas de Alá pode sem problema.

Ah, não repara muito no Deivisson, esse Sílvio Santos das marchinhas, mas curta a música.

Um abraço,

I.R.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Carta para Michael Phelps

Buenos Aires, 7 de fevereiro de 2009.

Prezado Michael Phelps,

Nunca pensei que um dia fosse escrever uma carta para você. E, claro, você já sabe que depois de tantos meses não estou escrevendo para te dar os parabéns por todas as medalhas de ouro conquistadas na última olimpíada.

Que você é um fenômeno da natação, isso ninguém duvida. Agora, que você fosse tão ingênuo, isso ninguém sabia.

Desculpe-me a franqueza, mas a sua ingenuidade me assustou. Então você pensou que poderia desafiar o mercado criador de herois e sair impune? Você achou que poderia ser apenas um nadador, um ser humano comum?

Não, amigo. Os criadores de heróis não perdoam nenhum descuido. E fumar maconha não condiz com a sua imagem usada para ganhar dinheiro. Um herói não consome maconha. Um exemplo para as criancinhas americanas não pode ter uma mácula.

Talvez se você tivesse tomado uma dose de uísque ou consumido uns comprimidos de Viagra ou tivesse sido visto com umas garotas de programa o seu heroísmo não tivesse sido abalado. Mas cannabis sativa, ganja, amigo? Teus patrões não perdoam isso.

Mas sejamos sinceros, todos sabemos que a maconha não melhora o rendimento de ninguém. Você de cabeça feita iria ficar, no máximo, mais lento... Talvez os seus adversários devam passar a te oferecer maconha antes das provas. Quem sabe assim você não perde algumas?

Tô solidário! Não é possível que precisemos de heróis imaculados, de símbolos, de exemplos para viver. Tenho pena das crianças que crescem acreditando em pessoas perfeitas e não se preparam para a realidade. Não somos santos. Não somos exemplo livres de manchas uns para os outros. E essas crianças crescem sem aprender a respeitar a vida privada da pessoa pública, num circulo vicioso à procura de um novo herói que substitua o que caiu em desgraça.

Bem, Michael, não tenho muito mais a dizer. Tenho pena de você por ter tido que dizer que tinha errado, que estava arrependido e que se aprende com os erros. Talvez você tenha aprendido tarde demais que o patrão criador de heróis não admite falhas. Tudo em nome das criancinhas. Tudo em busca de dinheiro.

Te mando um abraço. Te desejo força. E que o espírito de Bob Marley te acompanhe!

I.R.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Bilhete para a Tia Noel Eneida

Buenos Aires,

Oi, tia Noel!

Este bilhete público é para agradecer o seu presente de fim de ano. Você não faz idéia da farra que fizemos no Bom Retiro e no Brás, em São Paulo. Seu sobrinho, sua sobrinha e, principalmente, seu sobrinho-neto têm roupas novas. Nós já podemos sair para trabalhar e/ou estudar mais ajeitadinhos, e ele, que ainda não faz nenhuma das duas coisas, vai poder passear com roupas novas, coloridas, bonitas e duráveis. Ah, também houve alguns livros no presente. Para mim e para ele!

Bem, tia Noel, deixo aqui um pequeno presentinho virtual.



Um beijo,

I.R.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Korado

Para falar de Cora há que se ter cuidado.

Cora Rónai, cuja cara não corou ao escrever seu conto quase-erótico?

Cora Coralina, cuja poesia do cotidiano ainda hoje decora as ruas de Goiás?

A tia Cora de Zilka Salaberry em Véu de Noiva? Não, essa não é do meu tempo.

Que me desculpem as Coras de 40 anos para baixo, mas Cora, pra mim, é nome de senhoras de mais de 70. Coisa de tia mesmo.

Mas a Cora que me interessa nem é com C, é com K, kora. E que me desculpem os que chamam a kora de corá.

Mas deixemos de conversa e ouçamos a kora com o coração.

Toumani Diabaté



Kora Jazz Trio



E que a coragem de viver seja a nossa couraça!

I.R.