terça-feira, 29 de abril de 2014

#somostodossereshumanos

Foto: Bel Belloni

o peito do pé que controla a bola
é preto.
assim como são pretas as pernas,
os braços, as mãos e o rosto.
a bola gira como um planeta terra
ao redor de um sol preto.
e se fosse branco?
a bola gira para todos,
independente de sua cor.
somos todos humanos,
talvez descendentes do barro
que fez o primeiro primata.
somos todos seres humanos
em cima de uma bola que gira,
por mais que há quem insista
que ela gira ou que ela gire
só para alguns.

I.R.

segunda-feira, 28 de abril de 2014

ação

Foto: Hélvio Romero

contra as barreiras do ódio,
e os muros da indiferença,
batalhemos pela vida.
o amor destrói para construir,
desconstrói a ordem estabelecida,
porque está acima da ordem
e do estabelecimento das regras.
contra os muros da morte,
façamos pontes ou abramos buracos,
mas não fiquemos inertes.
a inércia é o estado de coma
que nos faz ver como normais
as muralhas que não são.

I.R.

domingo, 27 de abril de 2014

poema do absurdo

Foto: Luiz Alfredo Ardito

quantos poemas podem ser escritos
ao se ver uma árvore
em um processo de levitação?
surreal, puro chá de lírio, pretérito do impossível.
a raiz nua ou desnudada,
a raiz levantada, arrancada,
ou a árvore que se equilibra
entre a terra e o céu?
quantos poemas podem ser escritos,
ao filosofarmos sobre a raiz,
qual raiz? há tantas! em que solo?
embaixo do sol há tantos...
árvore plantada no espaço,
cujas raízes crescerão até o chão,
como as tranças de rapunzel.
árvore sustentada pelas nuvens,
já não quero escrever um poema,
nem quero entender essa metáfora,
quero apenas ficar aqui fora
e observar radicalmente esse mistério

I.R.

sábado, 26 de abril de 2014

maestro

Foto: Marcello Barbusci

me desculpem os puros e os puritanos,
os putos portugueses
e os putos da vida,
mas tem dias que a paciência
é uma ciência abstrata
inacessível a nós mortais.
me desculpem os inocentes
e as crianças, filhos da que labuta,
me perdoem os de ouvidos sensíveis
e os de olhos doces,
mas tem dias que o escape
é apontar o dedo médio,
como barbitúrico, como remédio,
contra todo o estresse,
contra toda essa hipocrisia da porra.

I.R.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

perguntas

Foto: Marcos Corazza

de que espaço falamos
quando falamos de espaço?
do espaço exterior
com suas grandezas e pequenezes
ou do espaço interior,
esse universo infinito?

de que tempo falamos
quando falamos do tempo?
do tempo cronológico,
passado, presente, futuro,
ou do tempo psicológico,
interior como o espaço imensurável?

de que falamos quando falamos?
do que queremos falar
ou do que pensamos que querem escutar?

tudo passa.
e é de passagem.
tudo é passo, seja lento, seja devagar.

I.R.

quarta-feira, 23 de abril de 2014

tocaia

Foto: Luiz Alfredo Ardito

o dinheiro, a fama e o poder,
o consumismo e as verdades absolutas,
a violência e a desonestidade, o egoísmo...
a vida está cheia de sereias,
sereias que cantam bonito,
iaras prontas pra nos afogar.
o que elas não sabem
é que nos achamos peixes...

o poder, o dinheiro e a fama,
as verdades absolutas e o consumismo,
o egoísmo, a desonestidade e a violência.
a arrogância, a presunção...
a vida está cheia de pescadores na beira do mar,
e nós, peixes, quase sempre com a boca aberta,
estamos prontos pra morder a isca.

I.R.

terça-feira, 22 de abril de 2014

estação

Foto: Vicente Sampaio

e se quando o caminho terminar,
terminar em uma parede feia,
remendada e sem graça?
isso invalida o caminho?
não entendo quem vive a semana
esperando um sábado de alegria
e um domingo à sexta de depressão,
não entendo quem trabalha um ano
esperando ser feliz nas férias,
não entendo quem vive amargurado
esperando um possível paraíso.
o barato, a curtição, o desfrute, o gozo
não estão no fim da linha,
mas na beleza do durante,
na paisagem e nos obstáculos do durante,
no durante enquanto o mesmo for durando.

I.R.

segunda-feira, 21 de abril de 2014

coleira

Foto: Evandro Amarante

liberdade pros pássaros
e pra meus passos
que não cantam,
mas precisam caminhar.
liberdade pros cães,
e pros meus versos,
que não andam em coleiras,
vão ao espaço,
elevados pelos braços
que o fazem existir.
liberdade, como um elixir,
que revigora,
força que vem de dentro,
não de fora, mas que volta,
porque tem que voltar.
liberdade para ser.
liberdade pra dentro da cabeça.

I.R.

sexta-feira, 18 de abril de 2014

escleroscópico

Foto: Hélvio Romero

aprendi com meu pai
que os dias de chuva não são feios.
aprendi vivendo
que o cinza, o escuro ou o pálido
não são piores do que o colorido,
e nem as cores são melhores que nada.
caminhamos por entre ilusões de ótica,
colorindo o branco da esclerótica,
imagens que um dia a esclerose
nos fará acreditar que realmente aconteceram.

I.R.

quarta-feira, 16 de abril de 2014

daqui

Foto: Luiz Alfredo Ardito

minha imaginação é uma foto surrealista
onde as palmeiras são mais altas que os arranha-céus
impressa num papel de lajotas.
minha imaginação é um desejo minimalista
arrebatado por uma menina feita mulher
deixando impressa na rua
a ausência de seu guarda-chuva
minha imaginação é um coletivo de sabores,
impresso em muitas cores
que arranha a terra também.

I.R.

terça-feira, 15 de abril de 2014

curiosar

Foto: Evandro Amarante

será a curiosidade, talvez,
algo inerente em nossa humanidade,
o que nos leva a querer ver
além das paredes brancas,
o que escondem os buracos,
ou as aberturas,
em seus tijolos.
a curiosidade não matou o gato,
o conhecimento
é um dos passos para a liberdade.

I.R.

sábado, 12 de abril de 2014

poema de amor

é como se a tristeza
ou o sofrimento
fossem mais poéticos do que o amor.
dizem, falam, comentam,
que o amor é brega,
feito de frases feitas
e só quando desfeito
rende melhores versos.
mas o amor não é simples,
colorido, brega, eterno
ou como um conto de fadas,
existe tensão no amor.
e os poemas de amor são tensos
como um beijo roubado,
os poemas de amor podem ser intensos
como um momento de paixão.

I.R.

quinta-feira, 10 de abril de 2014

flor de grupo

Foto: Simão Salomão

há flores nos vasos,
há flores vivas
e flores de plásticos,
há flores para os mortos,
flores para os tristes,
há flores de pedidos de perdão
e de conquista,
e há flores fruto da amizade,
flores que sorriem
e se compartilham
numa sintonia,
numa sinfonia do olhar.

I.R.

quarta-feira, 9 de abril de 2014

cartão postal

Foto: Antonio Manuel Pinto Silva

o cartão postal é uma instantânea micro
de um macro que excede os limites
(e os instantes)
impostos pelo papel.
papéis impõem limites,
estabelecem molduras,
que mesmo moldadas na maior doçura
terminam recortando o que considera excesso.
o cartão postal é um final feliz congelado,
uma semi-realidade, uma visão da verdade,
um aspecto de nós que é só o que podemos mandar.

I.R.

terça-feira, 8 de abril de 2014

guardados

Foto: Luiz Alfredo Ardito

guardei uma ideia
como quem guarda um doce.
comi um doce,
como quem teve uma grande ideia.

ideias guardadas não movem moinhos.

guardei um sentimento,
pensando ser boa ideia.
mas sentimentos guardados não iluminam.
sentimentos guardados não nos deixam voar.

I.R.

domingo, 6 de abril de 2014

o x das não coincidências







Foto: Luiz Alfredo Ardito     Foto: Jose Pedroso


vemos aquilo que pensamos ver,
e também o refletido
naquilo que vemos.

vemos o que queremos ver,
e o que nossos olhos veem
é um pouco o reflexo do que somos.
(ou do ângulo que estamos)

e se vemos o que outros viram,
ainda que seja com outro olhar,
não há coincidência...
há comunhão de 'veres'.

não há versus,
há versos,
diferentes olhares,
variados quereres
que se  enfrentam sem se enfrentar.

I.R.

sábado, 5 de abril de 2014

silêncio 2

Foto: Rodolfo Clix

a luz que coa pelas janelas,
(talvez sem vidros)
é iluminação filtrada
que ecoa em meus ouvidos
aquilo que não tem som.
minha via é minha vida,
e o silêncio é uma virtude
que não tenho.
falo demais, escrevo demais,
e me perco nos nevoeiros,
e nos letreiros de luz neon.

I.R.

quinta-feira, 3 de abril de 2014

de versos y versos

Foto: Hélvio Romero

não tenho a força dos samurais
nem a ginga dos capoeiras...
não sou modelo
nem manequim
para ninguém.
não posso ver pelos outros,
não posso escrever poemas de amor a quem não ama,
não escrevo poemas de dor para quem não sofre,
não levanto peso,
não poso imóvel
sem saber como irão me vestir.
não tenho a força dos capoeiras
nem a ginga dos samurais empunhando suas espadas,
não sou um artista...

soy un artífice del verso...
un versero,
como puedo...
o como se me da.

I.R.

quarta-feira, 2 de abril de 2014

timoneiro

Foto: Tani Guez

"sou o capitão e o remeiro,
sou o jardineiro
colocando um pouco mais de esterco"...

mas já deixamos o jardim,
por opção própria.

sou o capitão e o timoneiro
deste barco a motor,
e navego por barrentas águas conhecidas,
sem outro rumo que a própria viagem,
com o desconhecido que toda viagem tem.

I.R.

terça-feira, 1 de abril de 2014

rococó

Foto: Edu Sardinha

nem sempre está tudo azul,
mas se digo que está tudo cor-de-rosa
é porque tomo uma postura.
não falo de flores ou de espinhos,
abro mão dessas analogias,
renuncio a essas metáforas.
me exponho em caixas dentro de caixas
e se mostro só o que quero,
e se não mostro o que todos pensam ver,
me desculpem.
nesse mar de rosas,
sou o capitão e o remeiro,
sou o jardineiro
colocando um pouco mais de esterco
para ser uma planta maior.

I.R.