domingo, 14 de dezembro de 2008

Carta para um professor sádico

Buenos Aires, 14 de dezembro de 2008.

Prezado professor sádico,

Chegou a hora de você tirar a máscara. É fim de ano, época em que você pode exercitar a sua sede pela demonstração de poder. E é bom que os seus alunos saibam disso.

Você se esconde atrás de um salário baixo para preparar aulas meia boca para os seus alunos. Você se esquiva de suas responsabilidades como profissional dizendo que se os alunos não aprendem é por culpa deles, não sua. Você se protege das críticas colocando a culpa no governo, no descaso institucional com a educação. Você coloca a responsabilidade nas letras de funk, por exemplo, para mostrar que com essa “cultura” o aluno não pode crescer. Você ri com seus colegas dos erros ortográficos e gramaticais que os alunos cometem nas provas e acredita na farsa de que se ele errou o responsável é o próprio aluno por não estudar, por não ler. Isso quando não sobra para a professora da alfabetização, a Eva de toda a educação, quem primeiro fez o aluno morder a maçã e o condenou a uma eternidade medíocre, livrando você, amigo professor sádico, de toda a responsabilidade.

Essa carta não é um estudo sociológico, nem uma tese de nada. É um alerta para os seus alunos. Sim, um alerta, para que eles saibam que no dia do conselho de classe ou no conselho final (antes se chamava conselho de promoção... será que ainda se chama assim?), você, professor sádico, vai reprová-los, principalmente se as suas notas estiverem a alguns décimos da aprovação. E vai fazer isso com um sorriso nos dentes, dizendo que você, aluno, não vai ser aprovado porque ele, dono da verdade, dono de todo o saber e conhecimento, não quer. E o nosso colega sádico terá milhões de argumentos para justificar a própria decisão, e ai do professor que ousar questioná-lo.

Antes que eu seja esculhambado aqui pelos meus colegas, aviso: não defendo a aprovação automática. Mas gostaria de ver uma mudança no ensino onde o conhecimento não fosse ferramenta de exclusão, mas de inclusão social. Onde, por exemplo, a gramática deixasse de ser vista como uma coisa morta e sem sentido, mas que seu estudo ajudasse os alunos a serem críticos, a serem seres pensantes, não meros papagaios. Que o estudo da história deixasse de ser uma triste decoreba, para se tornar algo dinâmico, que instigue o aluno a pensar sobre o seu mundo de hoje analisando o passado, projetando, quem sabe, um futuro melhor.

Mas eu sei, professor sádico, que para você é mais fácil pegar a sua caneta vermelha e arrasar. A sua caneta vermelha é como um trator que passa por cima do respeito e da dignidade do ser humano, usando como justificativa para isso a falta de respeito que muitos alunos têm, num circulo vicioso que interessa apenas aos que desejam manter a sociedade do jeito que está.

A você, meu colega sádico que sente o prazer mórbido da reprovação automática, desejo um bom tratamento psicológico, nada mais.

Um abraço,

I.R.