quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Carta para um conversador

Buenos Aires, 4 de dezembro de 2008.

Prezado conversador,

Você já reparou que nós, pessoas, conversamos cada vez menos? Passamos horas no Messenger, ganhamos calos na ponta dos dedos mandando mensagens pelo celular, secamos a saliva em monólogos sem fruto aos que insistimos chamar de diálogo, mas que são menos férteis que o deserto do Saara.

Para quê?

Em minha opinião, não conversamos. Falamos, mas não ouvimos. Queremos impor nossas idéias, mas não queremos conhecer as idéias ou opiniões dos outros. Procuramos sair vitoriosos de uma conversa, que já não consideramos uma alegria da vida entre amigos, mas uma batalha com um inimigo a vencer.

Dizem que religião não se discute. Mas depois tivemos que mudar a frase para “futebol e religião não se discutem”. E agora já acrescentamos ou excluímos discutir sobre mulher também. Quer dizer, futebol, religião, mulher, sexo, cerveja, filhos, novela, dieta, doença, e um vasto etc, nada disso se discute.

Se a conversa é sobre religião, existe sempre a necessidade de provar para o outro que o seu deus é mais verdadeiro, que a sua religião é a única correta, e no caso dos interlocutores serem cristãos, que o seu Jesus não foi deturpado como o Jesus do outro. Não, amigo, você não vai me convencer de nada, vamos falar de futebol.

Mas falar de futebol é um perigo. Envolve as paixões pelos clubes e a rivalidade existente entre eles. Então o seu clube é mais vencedor do que o do outro, que sabe que venceu menos, mas lembra as vitórias mais importantes do próprio time e as principais derrotas do time do amig, digo, do adversário. Nem entre torcedores do mesmo time pode haver conversa, já que na “conversa” alguém sempre vai preferir um determinado jogador ou vai defender determinada política do clube ou vai dizer que aquele cara era ídolo, mas na verdade era um pereba.

De futebol não dá, vamos falar de música. Ah, mas eu curto funk. Não, o funk é uma porcaria, o bom mesmo é sertanejo. Sertanejo é brega, o negócio é dançar um forró universitário agarradinho. Esse negócio de universitário é que é ridícula, música boa é o heavy metal, coisa que no Brasil quase não se faz. O que é isso? Música é o rock dos anos 60. Anos 60? Amigo, falemos da bossa nova. Mas a bossa nova é um saco, o negócio bom mesmo era a jovem guarda. E não dá para juntar os dois e curtir um som do tropicalismo? É, eu sou amarrado em MPB. Mpb, que coisinha sem sal, o bom mesmo é um churrasco com pagode e cerveja.

Chega! Vamos falar de sexo. Em cima, embaixo, de ladinho, frango assado, cachorrinho ou coqueirinho?

Um abraço,

I.R.