terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Carta para o blogueiro Jose Francisco

Buenos Aires, 26 de fevereiro de 2008

Prezado José Francisco,

Depois de ter lido uma entrada sua no blog http://lagosalternativa.blogspot.com/, não pude deixar de escrever para você.

Preciso escrever para dizer que estou de acordo com você que eventos como o Cabofolia, feitos de qualquer maneira para o enriquecimento a qualquer custo são uma porta aberta para tirar o sossego e a paz dos moradores, não só de Cabo Frio, mas de qualquer cidade que o abrigue. Concordo em que muitas vezes o relacionamento homem-mulher de uma micareta, ou mesmo do carnaval de Salvador, reproduz velhos e pré-históricos conceitos de machismo, onde a “pegação” é a base de tudo, e a mulher também se torna parte importante desse processo, não mais apenas como objeto da “pegada”, mas também como “pegadora”.

Estou de acordo que a “fauna” atraída pelo Cabofolia é, em sua maioria, aquela formada pela massa pouco ou nada crítica, mas entrar numa discussão profunda sobre a massa não pensante, não crítica, de manobra, vaquinha de presépio, chame como quiser, não seria para uma carta, mas para um tratado sociológico. Só gostaria de dizer que esse tipo de pessoa não é exclusiva de eventos como o Cabofolia, mas encontramos todos os dias pelas esquinas, blogs, orkuts, shows de rock, casas de forró e barzinhos com música ao vivo da vida.

Agora, você já sabe, não é, depois de tanta concordância, vem a discordância. E onde eu discordo totalmente de você, é ao dizer que isso é fruto do axé. Você, textualmente diz: O axé representa tudo aquilo contra o qual eu e muita gente de bem luta. O que é isso, José? E a favor de quê essa gente de bem luta? (Essas definições sempre me causaram medo... gente de bem...) Se a gente de bem luta contra o axé, qual é o papel nesta farsa para quem gosta desse estilo musical?

Esta carta não pretende ser uma defesa incondicional da axé music, já que não sou fã de carteirinha do estilo e não curto grupos como É o Tchan, Companhia do Pagode, Terra Samba, Tchakabum, pois acho que suas letras são apelativas, e toda a sua estética parece ser um comercial de açougue, com a exibição de carnes nas vitrines. Mas reconheço que, ao menos, o grupo É o Tchan tem ou tinha uma enorme base de samba de roda baiano.

Sabe, José, o “inimigo” neste caso, é a mídia musical que aliena e determina o que escutar, é o empresário que pensa apenas no seu lucro sem se importar com o bem-estar da população, mas não é o axé. Ou você vai me dizer que não existem grupos de rock alienantes? Ou você vai me dizer que todo rock é independente e libertário e nenhum grupo responde aos interesses da mídia musical? Ou ainda, você se arriscaria a dizer que o show dos Stones em Copacabana foi um mar de tranqüilidade?

O “inimigo”, José, é o círculo vicioso que faz com que, na falta de educação, elejamos governantes que fazem seus próprios negócios e que até na prática do pão e circo, nos dão apenas circo, e não nos dão o pão da cultura (sem falar no pão comida mesmo). E é essa falta de educação cíclica que nos faz manobráveis, governáveis, influenciáveis pelos caprichos da moda e da mídia musical. A mesma mídia que nos vende Terra Samba nos vende NXZero. O mesmo gosto pelo dinheiro que cria o Cabofolia, leva os Stones para o Rio (evento que não foi organizado por altruísmo, já que não existe almoço grátis, tem sempre alguém pagando).

Bem, José, é isso. Não escrever um testamento. Talvez volte ao assunto em outra carta. Manda um abraço para aquela sua amiga, a Ana, de Portugal. A gente se vê por aí.

Um abraço,

I.R.

PS: Fiquei pensando, os que participaram da Marcha da Família com Deus pela Liberdade também se consideravam gente de bem. Ou não?

Chicléeeeeeeeeetêeeeeeeeee!!!