terça-feira, 30 de junho de 2009

Máscara



Foi num desses grandes eventos de moda que Christian Lacroix lançou a nova moda, marcando tendência. Ninguém esperava que na passarela surgissem modelos usando máscaras, dessas para se proteger do vírus da gripe A, com finos desenhos, assinados por pintores famosos, outras com pequenos diamantes ou ainda bordadas com fios de ouro.

Era preciso se proteger do vírus, mas com glamour, charme e elegância. As mulheres da classe alta foram as primeiras a aderir. Da noite para o dia, senhoras dos bairros classe A, como a gripe, começaram a aparecer com as mais finas e variadas máscaras. As lojas dos bairros e shoppings mais caros vendiam-nas com as mais variadas e caras customizações. O importante era fazer bonito. Combinar a máscara com a bolsa, com os sapatos ou mesmo com os brincos tornou-se fundamental. O batom passou a ser secundário, mas o lápis para os olhos passou a ter tons variados, para combinar com a cor predominante da máscara.

Os homens das classes mais favorecidas preferiam as máscaras mais formais, tradicionais, sem fios de ouro ou diamantes. Muitos, no entanto, bordavam as iniciais com ouro branco, ou procuravam máscaras que combinassem com as abotoaduras. A combinação de cores entre a máscara e a gravata passou a ser recomendada pelos especialistas em moda.

A classe média assistia a tudo, primeiro com desdém, depois com necessidade. Usar máscaras era um símbolo de status. E se não havia dinheiro para os fios de ouro e as pedras preciosas, não faltava criatividade. Pedras semi-preciosas, bordadas à mão com flores, pintadas com tribais, dragões, corações e fadas.

Não foi preciso esperar muito para que os camelôs da 25 de Março começassem a vender máscaras falsificadas feitas na China. As grandes marcas passaram a ser imitadas, copiadas e apareceram também os modelos populares. Máscaras com motivos de times de futebol, Corinthians, Vasco, Flamengo, Barcelona, Boca Juniors, Seleção Brasileira, para dizer apenas alguns, passaram a dividir espaço com as máscaras com a cara dos astros da música, da televisão ou aquelas com as cores da bandeira da Jamaica. Para as crianças a febre eram as que traziam as imagens dos seus heróis favoritos ou dos desenhos da televisão.

Até os animais, principalmente gatos e cachorros, ganharam suas versões de máscaras, vendidas por ambulantes em trens e ônibus.

Foi aí que eu percebi que algo não estava bem. Um dia saí na rua e vi que o único que estava sem máscara era eu. Ao me dar conta disso, achei engraçado e minha primeira reação foi não dar muita bola para isso. Só que as pessoas começaram a me olhar de um jeito estranho. Eu me sentia intimidado, perseguido. Comecei a sentir medo. Os olhares na minha direção foram se tornando raivosos à medida que eu continuava minha ida para o trabalho. Depois de chegar no metrô, enquanto esperava o trem na plataforma, não tive tempo de reação quando quatro mãos avançaram sobre mim e me imobilizaram.

O mundo estava de máscara. Nos telejornais, nas novelas, nos filmes, no teatro, nas ruas, todos usavam máscaras, menos eu. Tentaram me colocar uma à força, mas minha mordida quase arrancou um dedo do meu agressor.

Agora, escrevo estas linhas de dentro da solitária onde me colocaram. Sou sincero, prefiro estar aqui e escrever, isso me mantém afastado dessa praga. Eles não sabem que me fizeram um favor. Só espero que a Paranóia não me leia e venha me buscar.

I.R.