terça-feira, 30 de junho de 2009

Máscara



Foi num desses grandes eventos de moda que Christian Lacroix lançou a nova moda, marcando tendência. Ninguém esperava que na passarela surgissem modelos usando máscaras, dessas para se proteger do vírus da gripe A, com finos desenhos, assinados por pintores famosos, outras com pequenos diamantes ou ainda bordadas com fios de ouro.

Era preciso se proteger do vírus, mas com glamour, charme e elegância. As mulheres da classe alta foram as primeiras a aderir. Da noite para o dia, senhoras dos bairros classe A, como a gripe, começaram a aparecer com as mais finas e variadas máscaras. As lojas dos bairros e shoppings mais caros vendiam-nas com as mais variadas e caras customizações. O importante era fazer bonito. Combinar a máscara com a bolsa, com os sapatos ou mesmo com os brincos tornou-se fundamental. O batom passou a ser secundário, mas o lápis para os olhos passou a ter tons variados, para combinar com a cor predominante da máscara.

Os homens das classes mais favorecidas preferiam as máscaras mais formais, tradicionais, sem fios de ouro ou diamantes. Muitos, no entanto, bordavam as iniciais com ouro branco, ou procuravam máscaras que combinassem com as abotoaduras. A combinação de cores entre a máscara e a gravata passou a ser recomendada pelos especialistas em moda.

A classe média assistia a tudo, primeiro com desdém, depois com necessidade. Usar máscaras era um símbolo de status. E se não havia dinheiro para os fios de ouro e as pedras preciosas, não faltava criatividade. Pedras semi-preciosas, bordadas à mão com flores, pintadas com tribais, dragões, corações e fadas.

Não foi preciso esperar muito para que os camelôs da 25 de Março começassem a vender máscaras falsificadas feitas na China. As grandes marcas passaram a ser imitadas, copiadas e apareceram também os modelos populares. Máscaras com motivos de times de futebol, Corinthians, Vasco, Flamengo, Barcelona, Boca Juniors, Seleção Brasileira, para dizer apenas alguns, passaram a dividir espaço com as máscaras com a cara dos astros da música, da televisão ou aquelas com as cores da bandeira da Jamaica. Para as crianças a febre eram as que traziam as imagens dos seus heróis favoritos ou dos desenhos da televisão.

Até os animais, principalmente gatos e cachorros, ganharam suas versões de máscaras, vendidas por ambulantes em trens e ônibus.

Foi aí que eu percebi que algo não estava bem. Um dia saí na rua e vi que o único que estava sem máscara era eu. Ao me dar conta disso, achei engraçado e minha primeira reação foi não dar muita bola para isso. Só que as pessoas começaram a me olhar de um jeito estranho. Eu me sentia intimidado, perseguido. Comecei a sentir medo. Os olhares na minha direção foram se tornando raivosos à medida que eu continuava minha ida para o trabalho. Depois de chegar no metrô, enquanto esperava o trem na plataforma, não tive tempo de reação quando quatro mãos avançaram sobre mim e me imobilizaram.

O mundo estava de máscara. Nos telejornais, nas novelas, nos filmes, no teatro, nas ruas, todos usavam máscaras, menos eu. Tentaram me colocar uma à força, mas minha mordida quase arrancou um dedo do meu agressor.

Agora, escrevo estas linhas de dentro da solitária onde me colocaram. Sou sincero, prefiro estar aqui e escrever, isso me mantém afastado dessa praga. Eles não sabem que me fizeram um favor. Só espero que a Paranóia não me leia e venha me buscar.

I.R.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Sustos

Há coisas que assustam:

- golpes de estado,
- vitórias eleitorais da oligarquia,
- sucessivos empates e 6° lugar,
- os americanos, campeões de vôlei e basquete, aprendendo a jogar futebol,

ainda bem que algumas dessas coisas assustam, mas são um pesadelo de apenas 45 minutos.

I.R.

domingo, 28 de junho de 2009

sun day

só o sol
me mostra o que não quero,
e, como não quero,
aceito a peneira.
não adianta tapá-lo
com ela,
dizem,
mas as sombras
do arame
ajudam a não iluminar tudo.
só o sol não solidifica
e a solução,
o gosto que na boca fica
é o do vapor,
o da fumaça passando
pelos furos da tela.

I.R.



R.R.

sábado, 27 de junho de 2009

Tosse de 9 letras

Gripe A
Complexo B
Hepatite C
Dia D
Vitamina E
Bloco F
Ponto G
Hora H

I.

Tusso muito
e sinto dor
nos pulmões,
na garganta,
na cabeça,
mas estou feliz.
Tenho catarro
e não o H1N1.

I.R.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

O olhar. A pantera. O rei do pop. Lembranças

Pensei em começar escrevendo sobre o olhar de Daniel Alves antes de bater a foto que deu a vitória ao Brasil sobre a África do Sul. Fazia tempo que eu não via um olhar tão concentrado antes de bater uma falta. O gol foi muito bonito e fundamental para a seleção brasileira, mas sinto que nunca mais esquecerei esse olhar, essa concentração e essa certeza de fazer o que tem de ser feito.



Quando eu era pequeno, na porta do armário do meu tio, estava escrito Farrah. Aquilo sempre me intrigou. Eu tinha uns 5 ou 6 anos. Já tinha assistido algum capítulo de “As Panteras” na televisão, mas nada disso era da minha época. Eu não sabia o que era Farrah. Até que minha mãe me disse que não a questão não era “o que era”, mas “quem era”. E me explicou sobre Farrah Fawcett. Devo ter dito apenas “ah”. E se hoje comento isso, um dia após a morte da atriz, não é por uma memória afetiva em relação à Farrah, mas uma lembrança do meu tio, de seu skate, de seu dálmata e de como continuo gostando dele, mesmo à distância, mesmo sem, talvez, nunca ter dito isso a ele.




Mas um dia tem 24 horas, e a morte de Farrah Fawcett acabou ficando em segundo plano. Não é a primeira vez que eu vejo isso acontecer. A morte de Madre Teresa de Calcutá foi ofuscada pela morte de Lady Di. E a de Farrah se tonou uma nota minúscula em algum lugar perdido do jornal. Na primeira página, manchete, letras garrafais, a morte do rei do pop. Aqui, mais uma vez eu volto à minha infância.
Eu tinha 7 anos, quando num domingo, durante o Fantástico, o apresentador avisou que as crianças deveriam ser retiradas da sala, assim também como as pessoas mais sensíveis. Meus pais, zelando por mim, me fizeram sair. Foi assim que eu não vi o clip de Thriller.



Assim como Farrah, Michael Jackson também não é da minha época. Seus maiores sucessos, a coroação, a glória, tudo isso aconteceu quando eu era criança e não dava muita importância para a música feita por ele. A verdade é que os anos se passaram e nunca me tornei um fã. Uma pena. O cara além de performático, de inventor de danças, de tendências, era compositor, era fera.

Eu me acostumei ao Michael Jackson dos escândalos, e cresci criticando sua embranquecimento, seu nariz afinado, seu cabelo alisado, sem perceber que cada um é como pode, como dá para ser, e que por trás de toda aquela aparência que eu criticava havia um artista. Pedófilo? Não sei. Nunca provaram nada e eu não dormi com ele quando era criança. Polêmico? Sim. Perturbado? Aparentemente. Gênio? Sem dúvida. Apesar de não ser dos meus favoritos, o meu reconhecimento e os meus respeitos.





I.R.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Efémerides

Ontem, 24 de junho era um dia de recordação e de festa. Eu, particularmente, preferi falar de outras coisas e deixar os recordatórios para hoje, 25. Por quê? Porque sim. Sem nenhuma outra explicação complementar.

O dia 24 é um triângulo musical. Numa das pontas está Carlos Gardel, aquele que cada dia canta melhor, falecido num acidente de avião nesta data. Em outra ponta, também morto neste dia, em um acidente automobilístico, está Rodrigo Bueno, cantor argentino, da Provincia de Córdoba, de cuarteto. E na terceira e última ponta está São João, o precursor, que não morreu no dia 24 de junho, mas tem a sua festa comemorada nele. 6 meses antes do Natal.

E eu, no meio do triângulo, prefiro não falar sobre as minhas preferências. Não julgo para não ser julgado. Só quero unir o triângulo com a zabumba e a sanfona, tocar um tango e dançar cuarteto até o sol raiar.







I.R.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Reflexión

Há anos li esta pergunta e esta resposta do poeta José Paulo Paes à revista Veja:

VEJA — Um dos argumentos para aprender uma segunda língua bem cedo é que a pessoa poderá conversar sem sotaque...

PAES — Tenho um amigo italiano que tem um sotaque fortíssimo e se explica assim: "Por que vou falar tão bem uma língua estrangeira? Eu não quero ser espião". Ele diz mais: que falar língua sem sotaque é falta de caráter. Eu concordo. O sotaque é uma coisa adorável, pois guarda o passado de uma pessoa, sua história. E também pode ter seu charme. Quem, entre os homens de minha idade, não se encantava com a atriz de televisão que tinha sotaque francês arrastado e delicioso? O cidadão que enche a boca para falar de Primeiro Mundo é o mais Terceiro Mundo que existe. Não existe esse negócio de Primeiro Mundo. A imbecilidade também está no chamado Primeiro Mundo, a grosseria também está lá.


Se isto for verdade, talvez aí esteja a explicação para a minha falta de caráter. Apesar de ter aprendido sem sotaque depois dos 20. Minha história, meu passado, todos bem guardados em algum depósito portenho. Mas há outra não identificação. Fiz uma troca de terceiro mundo para terceiro mundo. Será que isso me absolve um pouco de minha canalhice?

I.R.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Nem primeiro nem segundo. Único

Morrer com 95 anos e desses, passar 90 fumando charutos, não é pouco. Aos 89 conheceu o sucesso mundial. Não superou a sua avó, que morreu com 106 anos, mas Maximo Francisco Repilado Muñoz pode se orgulhar de ter sido um dos maiores divulgadores da música cubana e um artista de primeiríssimo nível.



I.R.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Carta para o Almirante

Buenos Aires, 22 de junho de 2009.

Prezado Almirante,

A coisa tá feia, a bruxa tá solta e a luz de alerta foi acesa.

Quando, no final do ano passado, a queda para a segunda divisão foi confirmada, um conhecido meu, corintiano, me disse: “você vai ficar mal acostumado com as vitórias no ano que vem”. Se olharmos para a campanha do Corinthians na segundona, fica fácil entender essa previsão.

Aí o ano começou. Fomos garfados na Taça Guanabara, fomos eliminados na semifinal da Taça Rio, mas tudo bem. Era começo de ano, time em renovação, procurando o seu melhor entrosamento e o campeonato carioca é importante, mas também não tão importante assim para merecer o meu sono e a minha preocupação.

Eis que surge a Copa do Brasil, caminho mais rápido para a Taça Libertadores. E nossa caravela navegava com vento, firme, até a semifinal. E no segundo jogo com o já citado Corinthians, foi pênalti. Só o juiz não viu. Mas, enfim, garfados ou não, não adianta chorar sobre o gol não marcado, sobre a infração não cobrada. Lamento apenas o Gigante da Colina ter usado um time misto na derrota para o Paraná. Afinal, não temos tantos jogadores de reposição. A grana é curta e o que se vê em campo sofre com essa limitação.

Fato é que depois dessa derrota o Vasco vem acumulando empates da segunda divisão. Acostumado com as vitórias? Não! Desesperado com os empates. Não é possível que o líder da série B seja um time rebaixado este ano para a segunda divisão do campeonato paulista. E nós, com uma quinta colocação xinfrim, não estamos entre os 4 que sobem para a série A.

Almirante, abre o teu olho! Não vá me fazer a falseta de deixar a caravela bater num iceberg.

Mudando de assunto, você viu o Joel Santana dando entrevista em inglês. Eu achei um exemplo, e não é brincadeira. O cara não se acomodou. Correu atrás e mostrou que é possível aprender e ser delicado com as pessoas do país que o acolheu, mesmo que seja uma acolhida temporária, afinal, ele não vai ser técnico da África do Sul eternamente. Tem gente por aí criticando o sotaque e a maneira como ele fala. Essa mesma gente que vai a um show de rock e orgasma quando o artista gringo diz um “Bom noite, RRiou”, ou um “Muitcho obrigadou”. Força Joel! Menos no jogo com o Brasil, claro.

Ah, e falando de gringos, você, que é meio brasuca, meio portuga, por que não me contou que Saramago tinha um blogue? Rapaz, estava lendo as notícias do Brasil e me deparei com isso: http://caderno.josesaramago.org/ Tem uns negócios interessantes por lá. Eu não concordo com tudo, mas que o homem escreve bem, isso escreve.

Bem, Almirante, me desculpe por tanta informalidade. Acho que isso é fruto do sofrimento que compartilhamos. Bem, abre o olho! E que no final possamos gritar juntos “Terra à vista!”

Um abraço,

I.R.

domingo, 21 de junho de 2009

temporada

as ideias misturadas
e a sensação de sono
são a medida
da minha confusão.
à medida que o tempo passa
as nuvens não se dissipam
e o temporal é iminente.
ouço uma voz,
uma voz eminente
que não me deixa pensar
e separar as ideias.
raios de ansiedade caem
à minha volta
e a voz soa como um trovão
embaralhando a volta pra casa.
relâmpagos de sono
e gotas de delírio
caem sob medida em mim.
não uso guarda-chuva,
e as ideias são misturadas
à mão para não embolotar.

I.R.

sábado, 20 de junho de 2009

Bilhete para quem me lê




Buenos Aires, 20 de junho de 2009

Prezado,

Gostaria de escrever uma carta. Uma carta extensa, cheia de coisas interessantes, divertidas. Uma carta com sacadas geniais. Mas entre o pouco tempo para escrever, a aula que tenho para dar daqui a menos de uma hora e o macarrão com berinjela que estou comendo, fica difícil. No mais, agradeço as mais de 8000 visitas que este pequeno espaço recebeu.

Um abraço a quem me lê,

I.R.

PS: As baterias estão carregadas e as carrego junto a mim.

I.R.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

control c, control v.



copio e colo. não produzo.
quero ter sempre o controle,
mesmo à distância,
nem que seja o remoto.

I.R.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

de um barco para um sábio





o barco que me leva,
com o que marco minha rota,
me deu uma vela rota,
para abrir o meu caminho.

o barco que me traz
de vela em punho,
me mostra a noite
no meio da calmaria,
mas não tenho medo de embarcar.

I.R.

"Choro saber que o homem sábio por morrer se não souber nadar".

C.C.

Há tanto dito em poucas palavras. Há tanto entredito. Há tanto na ideia, nas entreletras desta frase de uma linha.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

arigatô

a toga manchada
com leite,
justiça em preto e branco,
segura uma balança caída.
como uma tatuagem marcada sobre a pele,
a toga mia
pedindo mais um pouco.
queda e degradação,
degredo e fracasso,
cem segredos de uma toga minha
sem costuras visíveis
que sempre me incendeia mais.

I.R.

terça-feira, 16 de junho de 2009

largada

late o cachorro
e abro os olhos lento,
a cabeça lateja depois da luta,
o chocolate pede licença
e minha olheiras,
maquiagem que não me delate.

I.R.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Bilhete para uma gênio cibernético

Buenos Aires, 15 de junho de 2009

Habemus internetum! Graças à sua incansável curiosidade e a sua não conformidade com as soluções oferecidas.

Para você, com dedicatória,



um beijo,

I.R.

domingo, 14 de junho de 2009

Imprevistos cibernéticos

Um blog sem internet não pode ser atualizado como quem o escreve gostaria. Estou sem internet em casa por obra e graça da senhora Telefonica. O jeito é acumular histórias e poemas para quando a situação voltar ao normal. O homem do século 21 já nasce com um mouse na mão e um wi-fi na cabeça.

I.R.

sábado, 13 de junho de 2009

Matemática de Santo Antônio

Nunca acreditei muito em santos específicos para determinados assuntos. Essa história de santo das causas impossíveis, ou a santa das tempestades, ou o dos males da garganta, ou o dos namorados, etc. Mas um deles ganhou o meu respeito. Santo Antônio, o santo casamenteiro.

Não, nunca fiz uso de seus poderes ou de sua interseção. Mas vi que Antônio é mesmo o cara.

Eu tinha uns 13 ou 14 anos, morava no interior do estado do Rio e era coroinha. Sim, quase todos os dias ajudava o padre, um não pedófilo, graças a Deus, na missa.

Um dia, eu estava na igreja quando uma mulher se aproximou do padre... como defini-la sem ser agressivo? Bem, uma mulher pouco agraciada no quesito beleza física. Ok, sejamos sinceros. A mulher era feia. Muito feia. Um tribufu. Baixinha (nada contra as baixinhas), com os ombros caídos, os olhos caídos, a boca meio murcha e na frente dos olhos caídos uns poderosos óculos grossos e verdes, um fundo de garrafa clássico.

Me lembro do diálogo entre eles.

- Padre, o senhor vai à Europa?
- Vou. Vou visitar a minha mãe na Polônia.
- O senhor vai passar pela Itália?
- Vou.
- O senhor faria um favor para mim?
- Claro que faço. O que é?
- O senhor compra um Santo Antônio na Itália para mim?
- Compro. Mas posso comprar um aqui em Niterói ou no Rio.
- Não, padre. Santo Antônio bom tem que ser italiano, legítimo!

O diálogo terminava ali. Anos depois o padre me confessou que achava que com aquela mulher, nem Santo Antônio daria jeito.

Então o padre viajou, foi à Polônia, passou pela Itália e trouxe o Santo.

Aqui há um hiato nessa história. Não sei que métodos de tortura aquela mulher usou com Santo Antônio. Talvez todos. deve ter colocado o Santo de cabeça pra baixo dentro do armário. Deve ter submetido o Santo a chicotadas, a humilhações, deve tê-lo chacoalhado, sacudido, e rezado um pouco também. Do tipo, morde e depois assopra.

O resultado veio algum tempo depois. Novamente estava eu na igreja, como testemunha ocular, quando vejo essa mulher, feia, feia, feia, chegar e dizer ao padre que estava ali para marcar o casamento dela.

Não sei se algo foi dito nesse momento. A surpresa era tanta. O espanto. O milagre.

Quando conheci o noivo, descobri que a máxima "há sempre um chinelo velho para um pé cansado" é verdadeira. O homem não era feio, nem mesmo Feio, ele era FEIO! E juntos formavam um casal exótico. Eles se casaram.

E tiveram um filho... que nasceu... lindo! É, nasceu lindo.

Foi aí que descobri que no amor, assim como na matemática, negativo com negativo dá positivo.

I.R.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Na véspera do dia dos namorados

Dia onze. Seis horas da manhã. Ouço gritos vindos da rua. Um casal de namorados discute. Ele se afasta e ela vai atrás. Gritam. Um diz ao outro coisas horríveis, provavelmente levados pelo calor do momento. Eu, como um voyeur, assisto a tudo pela janela do quarto do meu filho, que insiste em me acordar de duas em duas horas. Uma parte de mim tem vontade de abrir a janela e dizer aos namorados que a vida é uma só, passa rápido, e que é perda de tempo passar nossa existência em meio a discussões semi-públicas numa rua semi-escura deste ou de qualquer outro lugar. Outra parte minha quer abrir a janela e dizer que não discutam mais, que se separem, que cada um vá para o seu lado e que me deixem tentar dormir um pouco, pois a vida é curta e não vão faltar pessoas para eles conhecerem... e porque eu quero descansar pelo menos mais meia hora. Mas não abro a janela. Continuo na minha posição de espia, de voyeur, de observador da vida que é de outro, mas poderia ser minha. E é nessa postura, com meu filho dormindo em seu berço, atrás de mim, olhando por uma fresta da cortina que vejo a briga terminar com um beijo apaixonado. Não um beijo de novela, dramatizado e com um monte de gente por trás das câmeras. Um beijo real, mordido, molhado, voraz, onde a única testemunha era um incógnito eu escondido pelas cortinas de Winnie the Pooh. Um eu que já não tem mais nada para ver. Saio da janela e não volto a dormir com uma sensação contraditória de inveja e de pena.

I.R.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

divagando devagar que é pra não cansar

deixo o pensamento fluir
como se estivesse drogado...
a sanfona toca na televisão,
todos dormem,
o brasil venceu
e eu preciso dormir
mas não posso,
não quero...
quero que essa noite seja eterna
e eu não durma nunca
"luiz, respeita januário",
minha vontade é de ficar aqui
escrevendo coisas sem nexo...
minha vontade...
pausa para o riso,
para a gargalhada...
minha vontade...
conta outra que essa é boa!

I.R.

"luiz, respeita januário."

.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Nota para Mario Conde

Buenos Aires, 10 de junio de 2009

Estimado Conde,

no tengo ron o cigarrillo para compartir con vos. No tomo ron y no fumo, aunque si fumara, no lo haríamos juntos. Dice el Viejo que no sabés fumar. Pero no es para hablar de tus vicios que te mando esta nota. Es para agradecerte. Gracias, Conde! Gracias por permitirme entrar en tus historias.

En tu homenaje:



Un abrazo,

I.R.

PD: Saludos a Jose y al Flaco.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Dó, Ré, Mi



Maestro, por favor, eu quero um tom.
A música, onde está, senhor regente?
Responda-me num solo, simplesmente,
Se algum dia existiu em mim o dom.

O dom de fazer música, algo bom.
A arte de ser mal, ser diferente,
Ou se o que mais tentava diariamente,
Era equívoco e nunca foi um som.

Preciso de um moteto, de uma ária
Ou de uma sinfonia libertária
Pro som deste soneto tão absurdo.

E mesmo que eu não seja Villa-Lobos,
Escuto mil respostas, como os bobos,
Mas sou, como Beethoven, meio surdo.

I.R.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

a dor e o dólar

primeira classe
turista
executiva

no mar somos todos iguais.

enquanto isso na tv, alguns programas
ganham dinheiro com o sofrimento.

I.R.

domingo, 7 de junho de 2009

hora de não gostar

não sou o dono da verdade,
porém tenho direito às minhas opiniões,
que raramente digo.
ajo como uma parede de hospital,
branca e amorfa.
evito certas palavras,
procuro não machucar
mas uso um cilício.

então, chega.

não gosto de poemas sem ritmo
e de certas rimas previsíveis,
não gosto de prepotência,
de pieguice,
detesto poemas mal escritos
mas quase considerados obras de arte
e não entendo a falta de entendimento de alguns.

hoje, com uma ideia
e um blog na mão
qualquer um se acha poeta,
se acredita escritor
e ganha gritinhos dos fãs.

acho que vou publicar
os "poemas" que escrevi no primário.

minha parede branca ganhando uma mancha
e um cacófato.

I.R.

sábado, 6 de junho de 2009

o que antes


o que antes havia aqui
ficou na história,
mas é dessas histórias
que não precisam ser relembradas
com fotos,
com poemas.

o que antes havia aqui
fez por merecer ser só passado.

I.R.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

A corda tá russa

abro as bonecas,
matryoshka por matryoshka,
e no final há uma balalaica.
não sei o que fazer
com essa coisa triangular.
há de diferentes tamanhos...
um triângulo de três cordas
que se toca,
um cavaquinho estranho
que não sei se faz samba.
minha cabeça tá confusa.
definitivamente, a corda tá russa.

PS: Quando eu era pequeno, fuçando os livros do meu pai, de vez em quando eu abria um de literatura russa. Nunca li o livro inteiro. Na verdade, acho que nunca li mais de um poema...

BALALAICA
Maiakóvski (tradução: Augusto de Campos)


Balalaica
[como um balido abala
a balada do baile
de gala]
[com um balido abala]
abala [com balido]
[a gala do baile]
louca a bala
laica


BALALAICA

Balalaica
[budto laiem oborvala
scrípki bala
laica]
[s laiem oborvala]
oborvala [s laiem]
[láiki bala]
láicu bala
laica






I.R.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

verbalizado

viver é bom e perigoso
mas conviver é explosivo
e reviver, uma necessidade.

se fazer não é fácil,
refazer, uma urgência
e desfazer, uma possibilidade que não quero,

a solução é pôr,
não para compor,
mas recompor,
e não se opor, não supor,
e assim transpor,

pois não importa contradizer,
mas dizer as coisas como se sentem.

sentir e não se ressentir por se mostrar por inteiro.

I.R.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

futuro do presente e do pretérito

o futuro não conhecemos
e não sei se ele existe.
como saber se é como num filme
onde as cenas já estão gravadas
ou se é como tv ao vivo com roteiro
ou simplesmente improvisação?
temos o hoje para viver,
temos uma sucessão de instantes para viver
vida curta
cheia de caprichos e incertezas
viver é bom e perigoso
e o resto é passado.
mas do pretérito não podemos viver.
não é possível curtir umas férias
por meio das fotos
"estive em búzios e me lembrei de você"
"lembrança do rio de janeiro"
somos baús de quinquilharias,
somos museus
pois nossa única certeza é o passado
embora a esclerose nos confunda
antes de matá-lo completamente

I.R.

terça-feira, 2 de junho de 2009

matryoshka



persona

um eu escondido
em meus personagens

o belo por dentro da fera
a fera guardada no príncipe
o príncipe escondido no mendigo

um no outro, figura de desenho animado

ocultando do inimigo meu desânimo
guardo no âmago o desassossego
da minha animamundi revelada

exibido no animal planet
escondido em minha

ânima

I.R.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Ali

Ali na calmaria da bonança
Senti meu corpo em plena tempestade
E quis teu corpo, nova Sherazade,
Ser teu gênio, e do ventre ser tua dança.

Ali na noite inteira, a fera mansa
Quis ser como um marujo que te invade,
Simbad pirata, Ali Babá de jade
Ou quarenta ladrões sem esperança.

Ali na agonia do meu peito,
Ansiando por fazer tudo direito,
Assim vivo meu conto, não de fadas,

Pois temo que me roubem meu tapete,
Meu verbo, meu valor e meu verbete,
Ali nas mil e uma madrugadas.

I.R.