Era uma boa mulher. Honesta, trabalhadora, boa mãe. Só tinha um problema, que na verdade eu não chamaria de problema, mas um particular. Não gostava de fazer xixi.
Desde pequena, ir ao banheiro era um suplício. Considerava o ato de fechar a porta, abaixar o short ou a calça, a calcinha e se sentar primeiro no pinico, depois no vaso sanitário, degradante, humilhante. Foi por isso que usou fraldas até os 7 ou 8 anos de idade e só parou de usá-las porque o médico da família disse que o elástico das fraldas estava impedindo a circulação normal do sangue, já que estavam muito apertadas, e podia gangrenar as pernas.
Foi na adolescência que começou a fantasiar com a ideia de criar um sistema que eliminasse sua urina sem a necessidade de ir ao banheiro. E o início da sua fase adulta a viu como uma aluna super aplicada. Estudava química, fisiologia, mecânica, genética, tudo o que lhe permitisse eliminar o ato de mijar no banheiro.
Somado ao sentindo da humilhação, aos vinte e poucos entrava em jogo também a preguiça. Não havia nada pior do que sentir a bexiga apertada às 7 da manhã, quando ainda estava no melhor do sono.
Sua primeira tentativa foi inventar uma água que fosse cem por cento absorvida pelo corpo e eliminada pelo suor. Não funcionou. O suor passou a ser excessivo e por todos os lados, pés, mãos, cabeça, o corpo encharcado e com um cheiro bastante desagradável de urina. Ela até hoje se lembra de como foi constrangedor ter que explicar ao seu namorado na época, depois da transa, que cheiro e água eram aqueles.
Depois veio a tentativa de alteração em algum cromossomo, a de mudar geneticamente o funcionamento dos rins e por aí afora. Nada funcionou. Um dia teve a ideia de construir um sistema de canais em sua cama que permitisse que o xixi fosse feito com ela deitada e escoasse naturalmente para o vaso. Não resolvia todos os seus problemas, mas ajudava em pelo menos um deles, o de ter que se levantar quando não queria.
O sistema funcionou bem até que ela se casou. O sistema de escoamento passava do lado da cama que pertencia ao marido, e ele não estava disposto a se sentir como em Veneza todas as noites. Adaptar o sistema a uma nova cama requereria uma de uns 4 ou 5 metros de largura e não havia quarto suficiente para isso.
Cama nova, cama antiga desarmada, frustração e rotina incômoda novamente. A solução veio em um curso de parapsicologia que estava fazendo.
Ela descobriu que poderia passar o xixi dela para o marido e que ele poderia expeli-lo em seu lugar. Ao invés de transmissão de pensamento, mijo. No início não foi fácil. O marido não queria. Foi difícil convencê-lo. Principalmente em dias que saiam para comer uma pizza e tomar umas cervejas. Ele passaria a ir ao banheiro duas vezes mais. Por amor, ele aceitou. Fazia xixi por ele e pela mulher. A mulher, que no começo da experiência, ainda não dominava totalmente a técnica sempre retinha umas gotas, mas com o passar do tempo até essas passaram para o marido que as eliminava com uma balançadinha.
Todos felizes. E teriam sido felizes para sempre, se a mulher não tivesse tido a ideia de um dia passar o seu cocô também para o marido. Ela queria ir ao banheiro só para tomar banho e escovar os dentes. Sem lhe avisar, mandou o pacote completo. Como ela não tinha controle sobre o procedimento, o marido quase enfartou ao ver que seu pau não estava fazendo apenas xixi e pediu divórcio.
Agora, separada, ela pensa em armar a cama antiga novamente, enquanto não cria seu sistema revolucionário definitivo para a eliminação de dejetos humanos.
I.R.