domingo, 21 de setembro de 2008

Carta para a Primavera



Buenos Aires, 21 de setembro de 2008.

Prezada Primavera,

Antes de mais nada, gostaria de saber qual é o seu dia exato aqui no lado de baixo do Equador? É, pergunto, porque no Brasil o seu início pode ser no dia 22 ou no dia 23 de setembro, mas aqui na Argentina não.

Aqui na Argentina você tem dia fixo. E é hoje, dia 21.

Isso significa que hoje, ou na segunda, já que hoje é domingo, os jornais na televisão terão comentários mais imbecis do que de costume. E me desculpem pela palavra imbecis, mas é que os jornais ficam mais bobos do que o normal em certas épocas do ano ou com certas notícias.

Ah, mas aqui você não vem sozinha. Hoje também é o dia do estudante.

E é dia de ver certos lugares como a Costanera e os Bosques de Palermo lotados de rostos cheios de espinhas, consumindo litros de qualquer bebida alcoólica, ouvindo música, brigando, roubando e sendo roubado, tirando milhares de fotos com seus celulares para depois colocá-las em seus flogs, e doidos para terminar o dia em algum motel barato das redondezas, já que transar em público ainda não é comum por aqui.

É impressionante como o tal dia do estudante, associado ao dia da primavera, ou vice-versa, acabou se transformando num dia de tesão à flor da pele. A “tradição” começa com os cartazes da camisinha Tulipán espalhados pela cidade, depois continua com a azaração ao ar livre no próprio dia 21 e termina... bem, prefiro não saber, prefiro que me poupem dos detalhes sórdidos.

Agora, sabe de uma coisa, Primavera, devo confessar que não sou seu fã número um. Primeiro, porque não gosto das mudanças de estação, fico com o nariz muito mais sujo, se é que me entendem, e depois porque na primavera nunca sei muito bem o que vestir, já que de manhã há um frio de 8 ou 10 graus, e à tarde um calor de mais ou menos 20, e somos obrigados a levar o pulôver ou a jaqueta ou ambos na mão.

Mas voltando ao início da primavera, me impressiona ver gente que, com a sua chegada, e só por isso, diz já se sentir mais alegre, mais animado. Não sei... devo ser realmente muito estranho... ou será que é porque já não tenho idade para ficar bêbado no parque, tendo meu celular carregado de fotos roubado por alguém que também passou o dia comemorando a estação das flores e das alergias? Sei lá. Na próxima encarnação, quando for adolescente de novo, talvez eu descubra.

Sem mais, seja bem-vinda, um abraço,

I.R.

PS: Ah, só uma coisa e muitíssimo importante. A Tulipán pode até ter boas propagandas, mas o seu uso prolongado pode ajudar a produzir Santiagos.