Buenos Aires, 15 de outubro de 2008.
Prezados professores,
Não há nada mais demagogo do que escrever para alguém em seu dia, não é? Mas como não sou político e luto nas mesmas trincheiras, esta carta não é fruto da demagogia, mas nasce do desejo de comemorar com todos vocês este nosso dia.
Sobre a profissão, confesso que não fui eu que a escolhi. Fui estudar letras por falta de opção, quando dei por mim estava em sala de aula, no início penando, depois gostando. Mas ninguém me enganou com propostas sedutoras e irrecusáveis de uma vida fácil, com salários astronômicos e mordomias.
Comecei a dar aula conhecendo as regras do jogo. E imagino que a maioria de vocês também.
Mas não aceitem essa conversa mole pra boi dormir de que ser professor é um sacerdócio e que não importa que as suas condições de trabalho sejam péssimas, que o seu salário seja baixo, que falte material, que, em alguns casos, faltem instalações decentes para vocês e para seus alunos. Você não é um sacerdote. Você é um profissional. E como profissional tem direito a ter condições de trabalho; e como cidadão tem direito a um salário digno; e como ser humano tem o dever de tratar bem o seu público. Afinal, trabalhar com o público não é nem nunca foi fácil.
O que é fácil, é descarregar todas as frustrações nos alunos, lançar no aluno os próprios recalques, sentir na nota vermelha o prazer da vingança, a negação transferida ao aluno do que muitas vezes lhe é negado, seja lá o que for. O que é fácil, é com a desculpa do salário baixo dar uma aula medíocre. E vocês sabem tão bem quanto eu que há muitos professores assim.
Não acredito que o professor ensine alguma coisa. Acho que o professor mostra o caminho das pedras. Na verdade, quem aprende é o aluno, senhor do processo de aprendizagem. Nós, no máximo, podemos ser facilitadores ou ´dificultadores` desse processo. E quase sempre nos tornamos exemplo para nossos alunos. Exemplos do que eles querem ou do que não querem copiar. Podemos influenciar positiva ou negativamente no pensamento de alguém, podemos ajudar a formar seres humanos críticos e pensantes ou podemos continuar fabricando robôs, pseudo-máquinas dotadas de obediência, não de inteligência. Massa de manobra.
Colegas, desejo a todos nós um excelente dia! E melhores condições de trabalho e melhores salários para todos. Mas, sobretudo, a consciência de que ao preparamos uma aula o mais importante não é a matéria em si, mas o aluno que vai recebê-la. Sonho com que um dia os professores todos seremos críticos mostrando o caminho das pedras de uma real transformação da sociedade, para uma mais humana, mais crítica e com menos desigualdades sociais.
Abraços,
I.R.
PS: Aproveito para agradecer a todos os professores que tive em 21 anos de carreira escolar. Aos que me mostraram o que eu queria e o que eu não queria aproveitar como modelo tanto profissional quanto pessoal. Muitíssimo obrigado.
PS 2: Sinto que essa carta pode ser desmembrada em várias...