quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Carta para os meus vizinhos

Buenos Aires, 08 de outubro de 2008.

Prezados vizinhos,

Desculpe-me desapontá-los, mas devo lhes dizer que vocês não são originais. Nestes 33 anos de vida já me mudei de endereço algumas vezes, mais ou menos umas 10. E o que se vê aqui neste meu endereço atual não traz muitas novidades... se bem que a história de ontem... bem, essa foi uma novidade no currículo dos meus vizinhos.

Vizinhos, lá no Arraial do Cabo, onde morei, tínhamos como vizinhos um casal que brigava todos os dias, boa parte da noite. Mas não era uma briguinha de discussão, palavrão, um “te odeio” para cá, um “vou embora” para lá. Um “filho da puta” dito naquela casa soava quase como elogio. E os pratos, os copos, tudo o que fosse quebrável voava e se espatifava naquela casa, onde a mulher chamava pela polícia a cada nova briga. Ou seja, toda noite. Até que um dia a polícia apareceu para prender o marido. E a mulher fez um escândalo para que não o levassem.

Aqui em Buenos Aires também tive um casal briguento como vizinho. Uma noite, parte do edifício acordou com a reclamação em alto e bom som da mulher: “- As coisas não funcionam assim, você sai por aí para beber, chega bêbado e quer meter (isso mesmo, meter) às três da manhã!”

Nesse mesmo edifício morou um casal coreano durante um tempo. Sobre as brigas deles não posso falar muito, pois discutiam em coreano e eu não podia entender nada. Para dizer a verdade, nem sei ao certo se estavam discutindo.

Em outro edifício, tive uma vizinha que “praticava” canto lírico. Não sei se estudava, fazia um bico com isso ou se realmente era a sua profissão. O que sei é que à tarde era muito comum ouvir um “ma, me, mi, mo, mu; ma, me, mi, mo, mu”. Nesse edifício também tive vizinhas que tentaram fazer um gato na minha TV a cabo e teriam conseguido se isso não tivesse interferido na conexão à internet, e se a Chichi não as tivesse assustado com chamar a polícia se isso voltasse a acontecer.

Então, meus vizinhos, que alguns de vocês sejam meio esquisitos não é um problema. Alguns, em reunião de condomínio me cumprimentam, depois passam por mim no corredor e, quando muito, me dão um pequeno rosnido. Tem uma que nos oferece a sua agenda sexual. Hoje sim, amanhã não. Hoje sim, a tal hora. A cama faz “nheque-nheque” e ela emite ruídos.

Agora, vizinho com cara de bobo, você sim me proporcionou uma novidade. Nunca tive um vizinho que aparecesse com uma prostituta no edifício e, com cara de culpado, não cumprimentasse ninguém. Principalmente porque, infelizmente, você sempre cumprimenta. Eu não vi a trabalhadora, mas me disseram que era um pouco feia. É o que eu digo, se vai pagar, pelo menos compra um serviço um pouco melhor, não é? Se bem que quem nasceu para Sidra, por mais que o Champanhe não seja muito mais caro, vai morrer tomando Cereser.

De qualquer forma, todos vocês são fichinha ao lado do “De Repente Bar”, meu vizinho durante poucos meses, lá no Arraial do Cabo, quando eu tinha uns 12 anos. Um bar numa rua residencial, com show ao vivo à partir da meia-noite. Na inauguração, às 4 da manhã me vi acordado, sentado na cama dos meus pais, ouvindo um cover do Wando cantar “Chora Coração, iê, iê, iê, iê, iê, iô”.

Esses vizinhos sim, acho que serão imbatíveis. Vocês ao lado deles são amadores.

Um abraço,

I.R.