quinta-feira, 5 de junho de 2008

Carta para Lenine

Buenos Aires, 5 de junho de 2008.

Querido Lenine,

Desculpe-me a intimidade, mas é que ir ao seu show ontem foi como ter ido ao show de um amigo, de alguém que conheço e convive comigo há muitos anos. E o show foi ótimo. Eu sabia que seria, mas sempre tive medo de criar expectativas sobre qualquer coisa. Acho que criar expectativas é abrir a guarda para a decepção.

Ontem procurei não criar nenhuma expectativa. Mas fui para o show com certeza. Com a certeza de que seria ótimo. Primeiro ouve uma prévia jazzística de um grupo que não sei o nome. Confesso que nessa hora me senti num barzinho, com músicos tocando e um pessoal sentado atrás de mim que não parava de conversar. Cá entre nós, existe coisa pior do que ir a um show e ter que agüentar conversas alheias sobre assuntos que não interessam enquanto você quer ouvir a música que está rolando?

Essa introdução durou meia hora, enquanto você se preparava. O público estava indócil. Não éramos muitos. O teatro estava cheio, mas não lotado. Dava pra ver alguns espaços vazios. Mas acho que você viu bem que quando o show começou o teatro parecia ter o triplo de gente. Todos cantando, todos felizes por ouvir a sua música e ouvir a sua poesia.

Foi a primeira vez que fui a um show seu. No Brasil nunca coincidimos. Tinha que ser aqui. Por quê? Não sei. Mas teve de ser aqui. E os primeiros acordes, “todo mundo tem direito à vida, e todo mundo tem direito igual”, e o arrepio que eu senti, e a certeza de que a poesia vive. A poesia vive em letras como as suas, como as de Caetano, as de Gil, as de Cazuza, as de Renato Russo. A poesia vive na voz de Maria Rita, de Céu, de Maria Bethânia. A poesia cantada, a vida em forma de música, e toda a vibração e energia do seu Som.

E durante o show ouvir você dizendo que toda aquela energia era o resultado de muito trabalho, muito sacrifício, e a certeza de que valeu a pena você ter sido cabeça-dura.

E depois o desfiar de suas músicas, seus sucessos, todos conhecidos, de “Olho de Peixe” a “InCitè”, e os pedidos de bis, vários, e a sua volta ao palco, generosa. E depois do show, a pequena cereja em cima do bolo. Ir aos bastidores, como um/uma adolescente que vai ver o ídolo, e emocionado, dizer a você “muito obrigado por ser cabeça-dura”, e depois da frase dar um abraço em você, como aquele que se dá nos amigos.

Mas agora que estou quase terminando essa carta, pensando bem, poderia ter escrito apenas um bilhete. É, só um bilhete. Escrito em letras garrafais: MUITO OBRIGADO!

Um abraço,

I.R.



I.R.