domingo, 31 de janeiro de 2010

bar e barco

o nosso bar fica bem numa esquina,
numa quina da praia dos anjos,
onde a cortina de fumaça,
a brahma gelada,
o bate-papo
agora são parte de nosso barco.

I.R.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Versos emprestados

Às vezes leio/lemos poemas que gostaríamos de ter escrito. E digo no plural porque sentir isso não é privilégio ou exclusividade minha.

Agora, existem versos, melodias, interpretações que chegam a nós, batem em nós, no fundo do peito, da alma mesmo, e de um tal jeito que, pelo menos em mim, essa vontade de ter escrito tais versos passa completamente.

E nesse momento o único que quero é ouvir, curtir, absorver, compartilhar, deixar-me inundar por esses versos esperando que estejam se tornando realidade.


I.R.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

diferenças

há separações e separações
há dores e dores
se uma é triste por ser fim
outra é dura por ser começo.

I.R.

domingo, 24 de janeiro de 2010

empréstimo

não temos nada de nosso.
nossa!
não temos castelo nem fosso,
não somos menores
nem somos colosso,
e se digo plural
é por não querer sentir sozinho,
pois o fato,
e não sou eu quem diz,
quem me disse foi romeu,
é que não tenho nada de meu,
tudo o que tenho é emprestado,
até a minha vida é emprestada,
e é bom que assim seja,
já que se assim não fosse,
o vento mesmo já a teria levado de mim.

I.R.

sábado, 23 de janeiro de 2010

fragmentos de um dia

caminhamos num sobe e desce
de ladeiras
sob um mormaço quente.
não há vento,
nem um sopro refrescante,
apenas um bafo inclemente
que quase não nos deixa pensar.
a conversa flui entrecortada
e desemboca na tenacidade
da busca por um carro.
há carro.
há passeio.
as praias sem vento ocupam
o lugar das ladeiras
o passo é cansado e miúdo,
mas também mostra
e demonstra e confirma a tenacidade,
a força de vontade.
os índios assistem televisão...
"a gente vai se ver na Globo..."
e a busca pela pedra
se transforma quase numa viagem
de insistência,
numa aula sobre perseverança.
o vinho, o suco, a água,
não nessa sequência,
nem nessa necessidade,
resfriam ou esquentam o corpo.
quando se quer é possível.
assim como é possível ser amigo
de um antigo amor.

nunca deixei que se intrometessem na minha vida.

o telefone liga, mas não está ligando.

I.R.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Adeus a um homem simples

Arraial do Cabo, 20 de janeiro de 2010.

Prezados,

esse 'vaqueiro' já não está entre nós. Partiu como homem simples que era, com a simplicidade que sempre viveu. Nordestino, cearense, engraçado como tantos, batalhador como milhares, quis uma treta da sua garganta levá-lo do convívio dos seus.

Sei que foi em paz. Sei que está em paz. Na mesma paz simples em que sempre viveu. Sei que onde estiver, estará comendo umas castanhas de caju por mim, ao som de Luiz Gonzaga, músico que um dia, há muitos anos, me ensinou a apreciar.

Um abraço grande,

I.R.


I.R.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

tinta fresca

o corpo como instrumento musical,
marcando o ritmo,
ditando a intenção e a intensidade,
baila e balança
como num barco à beira-mar,
batalha de corpos,
balé de vontades,
bolha de sabão,
de desejo,
um beijo doce no meio do mar salgado.


I.R.

domingo, 17 de janeiro de 2010

amanhecer

gaivotas e urubus
caminham pela areia,
um homem, solitário,
nada num mar com cheiro de óleo,
o cenário que, dito assim, parece feio,
na verdade é intenso,
é belo,
com um fundo azul celeste
tingindo-se de laranja,
um resto de cerveja,
um leve toque de fumaça na boca.
o sol nasce na praia dos anjos.
mas ninguém me contou,
eu estava lá para ver.

I.R.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

sinais

sou um curvilíneo,
corcunda e sinuoso ponto de interrogação.
mas, plural que sou,
ser exclamação não é um paradoxo,
é apenas o meu lado
de postura ereta.
na dúvida sou reticências,
na vida abro aspas,
parênteses,
marco minhas falas com um travessão
e espero que haja muitas vírgulas,
alguns ponto e vírgulas,
mas falte muito para o ponto final.

I.R.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

colina sagrada

subo o bonfim,
as escadas sagradas do bonfim
e as lavo,
e as perfumo com água-de-cheiro.
subo o bonfim como quem sobe ao encontro de si
pedindo uma graça,
com a fita nos braços,
três nós, três pedidos.
subo o bonfim,
rezo ao bonfim,
e espero apenas um bom começo.

I.R.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Bilhete para um rockeiro nacional

Arraial do Cabo, 13 de janeiro de 2010

Prezado,

O atual rock nacional não é meu estilo de música preferido. Mas espero que o grupo cresça, que possa fazer um som diferente da mesmice que se escuta por aí. Eles estão começando e têm muita estrada, muita poeira e muito arroz com feijão pela frente para comer.

Para você saber, o guitarrista e segunda voz é meu irmão. E meu papel é dar aquele apoio.


Um abraço,

I.R.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

enquadrado

quis ter um picasso,
nem o viagra, nem o tesão me deixaram,
quis ter um el greco,
mas era turco e não pude.
quis ter um van gogh com as duas orelhas,
quis ser um zé de dome, um paulo franco,
quis ser drummond sentado no banco
com os óculos roubados para serem fundidos,
mas ele não era pintor,
e fudido estou eu,
por não ter um picasso
e porque minha antropofagia
precisa de um antiácido ou um epocler.
quis comprar não pude,
quis pintar não deu.
me restaram as paredes de casa
e meu nenhum estilo.
quero morar em um quadro.

I.R.

domingo, 10 de janeiro de 2010

repouso

sem carta, sem verso,
sem compromisso,
sem metáfora ou entrelinha
um descanso
para a batalha de mais um ano.


I.R.


sábado, 9 de janeiro de 2010

'atchésa'

sou peixe sem direção,
sem cardume,
sou escamas,
barbatana
fugindo da rede
guelra e boca
escapando do anzol.



I.R.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

à beira da terra

para o sonho à beira da terra,
na borda do precipício,
e faz um pedido
ao gênio que acaba de sair de um búzio mágico.

para o sonho à beira da terra
e pede um pouco de via láctea,
na borda do precipício,
tendo o gênio ao seu lado
lendo sua sorte na borra,
recriando seu futuro no tarô.

para o sonho à beira da terra
indo para o ponto que encerra
as verdades geniais não reveladas

na borda do precipício para o sonho,
à beira da terra o início,
não me oponho,
qualquer começo é o princípio do fim.

I.R.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

cabisteza

o calango toma sol,
lagarteando sem pensar em nada,
e quando a gaivota da vida
sai do mar do amor sem um peixe na boca
só me resta dizer...
uuuuuusca!


I.R.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

anjo da rama

o anjo abre as suas asas de seda
sob a lua minguante
e a neblina da noite.

tenta, mas não pode voar.

há manchas de óleo
em seu corpo,
há piche nas suas asas,
está num porto sem saída.

atracadores, rebocadores, navios,

sua auréola enferrujada sobre sua cabeça
é posta em seu pescoço
suas asas de seda,
sob a neblina da noite,
desistem de tentar.

seu corpo é amarrado
no topo de uma plataforma
também coberta de ferrugem,

e o dedo de um imediatista
se estica para que o anjo,
entre barcos, canoas, restos de tartarugas,
navios e plataformas
desapareça no que um dia foi um mar.

I.R.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Sandro

Para mim, um artista acima da classificação brega ou chique. Tenho a sensação de que os ídolos populares são uma categoria à parte na hora de pensar ou classificar o trabalho de alguém.




Uma pessoa que soube manter-se no topo da fama sem por isso ter de expor a própria vida. Espero que a sua morte não seja alimento para os abutres da televisão argentina e que a sua intimidade continue sendo respeitada.

I.R.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Meus Anjos

maria júlia e vítor
brincam de esconde-esconde
dentro de ana cristina

bem travessa a menina
retraído o menino
vindos de lá do longe
(na poeira das estrelas)
das entranhas divinas

mas têm tanta saudade
de onde eles dois vêm vindo
(saudade de fazê-las
as belas brincadeiras
voar pelo infinito)

que aí (sem perder tempo)
desistem dessa vinda
com a alma desprendida
dos corpos pequeninos
voltam à eterna vida.

Eraldo Maia

(Escrito pelo meu pai, para seus netos, meus sobrinhos, filhos de minha irmã, em um dia de muita tristeza para todos nós.)

I.R.

domingo, 3 de janeiro de 2010

ser e não ser

não se trata de certo,
incerto, errado, duvidoso,
nem da verdade nua e crua,
essa é a realidade dos nuances,
da desventura.
comprei um isqueiro.
preciso manter acesa a chama do meu vício.

I.R.

sábado, 2 de janeiro de 2010

35

de mim não posso falar,
nem a favor nem contra,
nem elogios nem críticas,
não sou o que acho que sou,
nem o que os outros acham que sou,
parte de mim é o que faço e o que digo,
com o que pensam de mim ou como me veem,
sabendo que o que realmente sou se esconde
em algum lugar onde nem eu nem ninguém
tem acesso,
pois se encontra em terreno inatingível.
conhece-te a ti mesmo e serás um iluminado.
tenho quase certeza de que nesta encarnação não vai dar.


I.R.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Bilhete de começo de ano

Arraial do Cabo, 01 de janeiro de 2010

Prezados,

o ano começou e com ele a única mudança foram os dois números depois de 20XX. Não existem passes de mágica.

Mas convenções, são convenções e é inevitável não sentir, pelo menos, uma pontinha de desejo de renovação, e a vontade de que seja inaugurado um novo ciclo, melhor, mais feliz, cheio de realizações.

Talvez isso seja inerente aos que, mesmo sem saber nada do futuro, acreditam que tudo vai dar pé, entre os quais insisto em me incluir. Talvez isso seja apenas falta do que fazer. Sei lá.

O fato é que hoje é primeiro de janeiro e as perguntas sobre o futuro batem à nossa porta. E se não temos resposta para todas ou até mesmo para apenas uma, talvez o melhor nesse primeiro dia do ano seja consultar uma especialista... a música.

Bom começo de ano e que a ressaca de vocês seja como a minha. Nenhuma.


Um abraço,

I.R.

PS: Amanhã o ano começa novamente.