terça-feira, 30 de julho de 2024

in-certeza

projeto, desejo, anseio,
me organizo, pretendo,
e me abro aos imprevistos,
inclusive no imprevisto
de esquecer essa palavra.
penso, questiono, duvido,
dou ouvido, desconfio,
e me abro a não saber.
não entendo as certezas,
porque não as temos,
e não as temos,
porque elas não existem...
ou talvez existam
(nesta contradição e na morte).

I.R.

sexta-feira, 26 de julho de 2024

capital

na amizade, no amor, na vida,
permito a permuta,
e prefiro relacionamentos de troca,
não relações de capital.
o capitalismo arquiva a emoção,
engessa a poesia,
com seus agiotas e banqueiros,
seus cobradores de impostos.
o capitalismo de amores supostos,
sem brilho nem luz, só mais-valia,
sabe que nem tudo que brilha é ouro,
e não esconde um tesouro
mas um outro num hoje abrumado.
e se não me queimo no fogo da paixão,
não me queixo,
prefiro o sem sentido...
choque térmico de um banho-maria invertido,
banho de sal grosso na beira do rio.

I.R.

segunda-feira, 22 de julho de 2024

respostas

‘porque sim’ não é resposta,
porque não explica,
só deixa a consciência aflita,
e gera um efeito cascata,
como bola de neve,
deixando uma ansiedade
que nunca nos faz nada bem.
mas nem todo porquê é claro,
matemático, científico,
nem todo motivo é específico,
e nos tira da nebulosa.
é preciso decantar, ou talvez cantar
e permitir que as ideias serenem,
longe do canto da sereia,
dos encantos do tritão.
respostas são processos
que me levam tempo
respostas são elementos
que nem sempre eu vou ter.

I.R.

quinta-feira, 18 de julho de 2024

reverbera

eis que
numa era,
o era já era,
num golpe,
num dia,
num gole,
num coice,
sem ira
nem eus,
até o fim,
assim,
sem réus,
na foice...
e foi-se

I.R.

domingo, 14 de julho de 2024

executante

gosto de ler poemas em voz alta,
poemas dos outros,
gosto de sentir o impacto
que causam, que me causam,
e me vejo intérprete,
como bethania, como ney,
e sinto que o poema só existe,
só, de fato, é,
quando lido em voz alta,
quando não lido com a vida do poeta,
mas permito que seu texto
entre em mim pela palavra que sai.
mesmo que eu não o entenda,
mesmo que eu gagueje, 
que eu perca o fôlego, 
ou só balbucie... 
poemas são como pássaros, 
não nascem para estar em gaiolas 

I.R.

quinta-feira, 11 de julho de 2024

(des)vario

quando seremos quem somos,
quando seremos sem máscaras?
mas como dizer quem somos,
se também somos nossas máscaras?
somos casca e conteúdo
o que aparentamos ser,
o que somos sem saber.
somos começo e fim, enfim...
mas por que escrevo no plural,
se no fundo falo de mim?
talvez porque seja plural,
porque sou e somos plurais,
como alguém dissociado, como deus...

ou fernando pessoa.

I.R.

domingo, 7 de julho de 2024

leitura em como dá

e se eu escrevesse sem pontos
nem vírgulas e quebrasse
o verso em qualquer lugar
como se leria o poema com que
intenção
se entenderia o que se passa
na minha cabeça enquanto escrevo
a dificuldade de entender o que penso
além de toda
dificuldade
de apenas ler e sentir que
o texto significa alguma coisa
em uma existência que busca
sempre existe algum sentimento
o único vazio é a falta de sentido

I.R.

terça-feira, 2 de julho de 2024

reflexões de bolso

a alegria não é mais
nem menos efêmera
que a tristeza...
vou pensando, enquanto ando
e as chaves batem no bolso,
como um guizo de cascavel.
tenho sangue venoso e arterial,
não sou venenoso,
pelo menos de forma literal.
continuo a caminhada,
um pé depois do outro, ao pé da letra,
e penso na palavra-chave...

que a porta que ela abre,
ela também pode fechar.

I.R.