segunda-feira, 28 de outubro de 2024

passado por água e sal

o que damos nome
e o que nem sabemos nomear
é a consciência do inconsciente,
ponte que se estende,
se entende, entre dois mundos,
decifrando mitos, derrubando muros.
minha lágrima, salgada como toda lágrima,
é mais que uma lágrima, é um mar.
e é no mar onde volto às origens,
onde volto a ser
 animal marinho.
é na lágrima, meu mar, que informo
tristeza, alegria, fantasia, carinho...
riqueza de sentido...
porque o mar é curativo,
e a lágrima que escorre
mostra que a cura vive dentro de mim.

Igor Ravasco

quinta-feira, 24 de outubro de 2024

'latidos'

o não ter o que dizer (o não poder),
quando se quer falar, mas não se pode,
pois há saída, mas não ação,
sufoca.
o lado b do vinil que não faz sucesso
é um abscesso, tinta para uso externo,
sepulcro caiado, publicidade de margarina.
queria escrever um poema de amor,
mas esse é o embate...
escrevo como quem late
para uma bicicleta, uma caravana,
queria escrever para quem amo,
para quem ama, rima assonante,
mas escrevo como quem uiva,
talvez para a lua, talvez de dor.
e agora josé? e agora francisco?
qual é o buraco na tua rua?
qual é a trave no teu olho, qual é o cisco?

Igor Ravasco

terça-feira, 22 de outubro de 2024

bocanada

tusso, mas não fumo,
e, se tusso, pra mim é tácito
que minha tosse é emocional.
e eu sei, eu sempre soube,
que minha tosse é o acúmulo do não dito,
é o cúmulo de um eu aflito,
querendo aumentar os decibéis
de sua voz
com a autoridade de um locutor,
de um solo de um tenor,
de um trovão que antecede a chuva
que molha o solo.
tusso em busca de uma golada de ar fresco,
porque a respiração antecede a rajada
e o raio é certeiro.
preciso de ar puro, preciso de prana.

o ar é a razão.

Igor Ravasco

quinta-feira, 10 de outubro de 2024

um, sete, um

pra não enganar ninguém,
repetir sempre faz bem...
não sou poeta nem artista.
sou um 171 das palavras,
um estelionatário,
faço um estelionato literário,
mas sem levar vantagens,
nem causar prejuízos,
além de dois segundos de perguntas.
sou apenas um reflexo,
um espelho de corpo inteiro,
um vigarista sem nexo nem interesse...
então, que fraude sou?
que golpe eu aplico?
que xou da xuxa é esse? 

I.R.

terça-feira, 8 de outubro de 2024

síntese

quero ser sintético, não tão sintático,
simpático, sem ser otário,
escrever este diário, quase rezando,
para um não-deus sincrético.
quero ser herético e semântico,
um não-romântico,
vibrando em sintonias quânticas,
em frases cômicas,
sob um céu cor de crômio.
não quero a hipotermia, nem a hipotenusa,
quero ver a medusa, de cabeça cortada,
me lembrando a estátua de pedra,
que um dia eu fui.

I.R.

quinta-feira, 3 de outubro de 2024

intu(indo)

intuo teu sendo,
tateio tua senda,
tua percepção, fruição...
com gosto de fruta madura
colhida por fortuna no pé,
de pé... e acordado.
intuição é mais que pressentir;
é sentir...
e dar voz... (à própria voz).

I.R.