sexta-feira, 30 de novembro de 2012

luz e estrada

Foto: Luiz Alfredo Ardito

a luz no fim da estrada
e a estrada mesma
não têm um sentido religioso,
nem místico,
nem sobrenatural.

mas a luz no fim da estrada
e a estrada mesma,
assim iluminada,
assim transparentemente iluminada,
trazem as marcas do natural.

e o natural é que a vida segue seu curso,
e o pensamento e o discurso
são caminhos com curvas,

e as marcas de pneu na estrada,
são a prova de que nada
é agora como um dia se conheceu.

I.R.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

siga a seta

Foto: Jose Roberto Magalhaes

se perdi o rumo
ou se perdi o prumo,
não foi por imprudência,
foi por pressa,
por impaciência,
por ter muitas alternativas
e nenhuma opção.

I.R.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

redes

Foto: Bikramjit Debroy

vivemos um mundo de redes
e a rede que conecta
não é a mesma que roda,
mas rede, enfim,
rodopia, gira,
e pesca,
uma música, um programa, uma foto,
uma amizade ou um problema.

eu não pesco,
e peco pouco,
porque minha rede não gira,
não roda, não rodopia,
balança, levemente, pra lá e pra cá
ao sabor da brisa.

e a rede, teia humana
segurança e fonte de alimento,

a rede também roda,
gira no ar
e cai no rio
ou cai no mar,
lançada
pela habilidade do pescador.


I.R.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

mera maré

Foto: Tato Souza

a mera menção da palavra arte
não é garantia de nada.
a mera menção da palavra mero
não é garantia de rede
ou de mesa farta.

a mera menção da palavra bênção
não garante a oração,
a mera menção de mencionar
não é garantia de não estar
em cima do muro.

e eu, marujo velho,
não devia,
mas me mareio
ao sabor da maré.

I.R.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

bate o sino









Foto à esquerda: Angela Zaremba                                                                                                                   
Foto à direita: Helo Von Gal

de perto ou de longe,
importa a distância?
a verdade nunca é uma só.
sempre existem, pelo menos,
dois sinos batendo,
cada um com seu tom,
cada qual com seu soar.

mas os desavisados,
aqueles que ouviram um sino tocar,
mas não sabem onde,
pegam o primeiro badalo que ouvem
e o declaram verdadeiro,
e o estipulam e o estimulam
como certeza,
verdade absoluta.

mas de perto ou de longe,
a distância só importa
para nos fazer ver e ouvir
vários sinos, vários badalos,
diversos tons, variados sons,
verdades várias
anunciadas por um
ou por muitos carrilhões.

I.R.

domingo, 18 de novembro de 2012

do andar


Foto: Leticia Gontijo

se caminhamos sozinhos
ou acompanhados
é uma decisão pessoal.

também se caminhamos,
é uma decisão
que depende de cada um.

mas caminhando ou parado,
com os pés retos
ou esticados,
o segredo da companhia
ou da solidão é sempre o mesmo...

a resposta não está na cor do sapato,
o mistério não está na forma do laço,
mas como fazemos a bainha
e se pisamos ou não na calça
enquanto andamos.

I.R.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

dar e receber

é dando que se recebe,
mas o que não se percebe
é que não se recebe nada em troca.
não existe troca quando se dá.

dar, ceder, doar, conceder,
é um ato de desprendimento
e desprender-se é estar livre,
e estar livre é o ponto de partida
para qualquer doação.

dar e ir além da dor,
doar comida,
dinheiro, roupa,
doar o próprio tempo,
ir contra a corrente
e contra o vento,
não receber nada em troca,
pois o que nos move e o que nos toca
não são as recompensas.

é dando que se recebe,
que se recebe a satisfação
pelo gesto de dar,
e por mais nada
pela alegria de doar,
e por mais nada.

I.R.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

de pedra

Arte: Caravaggio

a fama de uns
é o anonimato de outros.
todos somos iguais,
exceto na genialidade artística,
no que conhecemos
e no que sabemos ou não fazer.

a arte tem poderes petrificantes,
e os olhos arregalados da medusa
fazem com que suas serpentes
me deixem paralisado diante do seu sangue,
me faz um desigual
diante do seu retrato.

I.R. 

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

para m.e.l.

hoje é catorze,
mas não importa que seja catorze,
pois na verdade não é.
hoje é treze,
porque todos os dias são dias treze
e comemorar o amor não tem dia
nem hora nem lugar.
hoje é treze.
amanhã é treze,
e até o dia treze
é treze também.

I.R.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

mãos de fé


Foto: Jonas S. Medeiros

as mãos do homem de fé agradecem
antes de implorar.
as mãos do homem de fé louvam
antes de pedir.
as mãos do homem de fé
nem mesmo precisa rogar,
pois o home de fé sabe
que a natureza segue seu curso
e que deus não está mais no céu
do que no calor de suas mãos.

I.R.

sábado, 10 de novembro de 2012

o que não sou

não sou profeta
nem poeta,
menos professor.
pois não profetizo,
não poemiso,
não ensino,
mas desde menino
professo o amor.

não sou aquele que prometeu
nem sou aquele prometeu
porque nada prometi, nada roubei,
nem o fogo nem a água
e meu fígado não guarda mágoa
de nenhum abutre qualquer.

I.R.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

alternativas


Foto: Marcia Vasconcellos

o vazio e o sentimento de vazio,
o apego ao vazio,
e a dependência...
... da luz elétrica,
do celular, da internet...
o apego à rotina,
e a sensação de perda,
de ausência,
normalmente estão por perto
querendo nos abraçar.

mas a ausência pode ser só aparência,
algumas bicicletas não tem rodas
porque podem voar.

I.R.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

a invenção da roda


Foto: Cris Almeida

a roda da fortuna
às vezes traz miséria.
e a roda dos renascimentos
pode ser o consolo do apego.

há dor na roda de tortura.

a roda gigante, onde cada rodado
leva em si um sonho rodante,
para depois de algumas voltas,
mas a impermanência não é circular.

o homem não criou o círculo,
inventou a roda,
e agora a roda que o homem adora
nem sempre é redonda, mas retangular.

mas roda também é brinquedo,
é colorido folguedo, roda viva, ciranda,
travessura de criança anotada no rodapé.

I.R.

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

iluminação


Foto: Denise Autran

as luzes dançam sobre nossas cabeças,
(iluminadas e avoadas...)

balões acesos iluminam nossos pensamentos
enquanto ouriços sem espinhos espetam nossas ideias,

(fiat lux)

dando à luz à nossa imaginação.

I.R.

domingo, 4 de novembro de 2012

minha pátria é minha língua

se minha pátria é minha língua,
e minha pátria é minha língua,
não sou brasileiro.

se minha pátria é minha língua,
e minha pátria é minha língua
sou quase português,
e tenho alma triste e melancólica do fado.

mas se minha pátria é minha língua,
e de fato minha pátria é minha língua,
não sou apenas português,
porque sou cabista...
"muita coisa".

e "ô êdja" se escrevo e não me entendem,
mas, "hã, que é", o poema sempre tem um quê de pessoal
e ininteligível.
"cala a boca"!
e se você, "galo", estava lendo o poema até aqui e desistiu
por não entendê-lo,
de fato você não entende nada...
"usca, diá!"

minha pátria é minha língua, "galo!"
"baca!"

I.R.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

asas e pés da liberdade


Foto: Jose Pedroso

um homem livre tem uma mente livre,
voa como os pássaros
e sonha como um homem.

um homem livre venceu o tempo
e nenhuma grade
foi grande o suficiente
para aprisioná-lo, sufocá-lo,
para torná-lo coisa.

um homem livre tem uma ação livre,
voa como os pássaros,
mas vive como um homem.

I.R.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

começou novembro

começou novembro de novo,
e novembro não é o mês nove,
assim como setembro não é o sétimo,
o oitavo não é outubro
dezembro não é o mês dez,
e a segunda, na prática,
é o primeiro dia da semana.

a quem importa?
vivemos assim a séculos
e a nomenclatura não faz o tempo,
e o tempo não importa.
o que conta é o que fazemos com ele.

I.R.