sábado, 3 de dezembro de 2011

Carta para um cristão

Buenos Aires, 03 de dezembro de 2011.

Prezado amigo cristão,

Ver no outro um ser, não uma coisa, é um exercício, uma prática, que nos leva à igualdade, à tolerância, à justiça social. Como ouvi certa vez, o primeiro passo nem precisa ser 'amar ao próximo como a si mesmo'. Esse é um nível mais avançado. É possível começar com algo mais simples como, 'não fazer ao próximo aquilo que não quero que me façam'.

Ultimamente, vejo que muitas pessoas religiosas se fecham na ideia de que é preciso falar mais de Deus ou exibir seu amor a Deus, como se esse Deus fosse o resolvedor de todos os problemas por meio de seus milagres, (e se esses milagres não aconteceram foi porque ou o homem não teve fé o suficiente, ou não rezou/orou/dobrou o joelho o suficiente), como se esse Deus participasse da vida do homem controlando-o sabe-se lá de que parte do céu, ou como se o ser humano precisasse garantir uma vaga na outra vida assumindo um amor explícito por Jesus.

Mas "Deus" não une, "Deus" divide.

Se não bastasse a diversidade de religiões e seus variados Deuses, dentro da religião majoritária do ocidente, o cristianismo, existem formas variadas de se crer nesse Deus cristão, diversas concepções sobre Jesus, e cada fiel querendo provar que a sua é a verdade que libertará.

O mundo já tem Deus (ou Deuses) demais, e nem por isso é menos violento e menos injusto. O mundo precisa de uma boa dose de humanidade. O ser humano precisa se relacionar com os seres humanos como seres humanos, não como coisas, objetos, meios para a própria satisfação. Isso não significa um mundo ateu. Isso significa que não importa se você acredita ou não em Deus, não importa em que Deus você acredita, mas significa que o diálogo entre os seres humanos foi retomado.

Eu, e apenas eu, sou responsável pelo diálogo com o outro, fazendo de mim um responsável pelo outro. Você, e apenas você, é responsável pelo diálogo com o outro, fazendo de você um responsável pelo outro.

E não importa que você acredite em Jesus como salvador e eu não. Não importa que você acredite em um paraíso numa vida eterna futura e eu queira um paraíso aqui e agora. Não importa que você me considere um utópico. Eu me relaciono com a sua humanidade, assim como você se relaciona com a minha. E juntos nos ocupamos um do outro. E não falo de amor. Falo do compromisso de não fazermos aos outros aquilo que não gostamos que façam conosco.

Um abraço,

I.R.