sexta-feira, 28 de março de 2025

por meio da linguagem

palavra, tu és...
és pura, espúria,
escura, és cura,
és espuma,
estrutura,
escultura... 
palavra, tu és fúria,
e se esfuma
como escuna
no espaço
que a vista alcança

Igor Ravasco 

quinta-feira, 20 de março de 2025

desolação

o ser humano, tão parte da natureza
quanto uma árvore, uma águia ou uma ameba
se sente separado dela
e se guia pela dualidade.
não vê que destruir a natureza
não é um crime, mas um suicídio.
que mundo deixarei a meu filho?
em que mundo queimarei
em verões sufocantes?
em que momento nos insensibilizamos
diante do sofrimento do outro,
que também somos nós?
por acaso o choro das crianças em gaza
é menos importante do que o choro
nos campos de concentração
da segunda guerra ou em todas as guerras?
o que não deixa dormir direito
é o cansaço de não me entregar ao pessimismo.
não verei um mundo melhor,
não deixarei a meu filho um mundo melhor,
só posso deixar a esperança.
essa que luto todos os dias para não perder.

Igor Ravasco

domingo, 16 de março de 2025

no bico

o que me distrai me destrói
se não for feito com consciência.
piloto automático
ou ponto morto,
o anestesiado não está absorto
em seus pensamentos.
quando rasgaremos as camisas de força
(auto)impostas pela alienação?

                    nunca existirá na farmacologia
                    um remédio contra a separatividade.

sou beija-flor levando água no bico
pra apagar uns incêndios.

Igor Ravasco

quinta-feira, 6 de março de 2025

o que é um poema?

talvez se eu disser que isto
não é um poema, você leia este texto
como receita ou prova de química.
mas se eu disser que é um poema,
“algodão,
caneta,
ovo de páscoa
e papel higiênico”,
deixam de ser palavras de uma lista
(bastante aleatória) de supermercado,
e é poesia, lida e interpretada
por “olhos-de-ler-poesia”
e que o leitor interprete o que puder,
pois a brincadeira por trás do texto
é uma senha na mão de poucos...
bicicleta, oito anos, voltas pelo labirinto,
desafio, memória, história... poema...
que não era, mas agora é.

Igor Ravasco


quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025

perdão

se errei te peço perdão...
não!
não funciona assim.             
mas...
porque errei,
e reconheço meu erro,
e não me vanglorio,
e sei o mal que causei,
peço perdão,
sem falsa humildade,
sem botar nos outros a culpa
ou a responsabilidade,
sem achar que, no fundo, tenho razão...
pois não tenho.

Igor Ravasco

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

estimação

não são milímetros
nem quilômetros,
não são centímetros
o que mede o sentimento.
uma relação fria, uma relação plena,
sólida, tóxica, pura... 
relações não se medem com trena.
também há ausência na presença.
ou plenitude na lonjura.
o que distancia não é a distância,
o que separa é a indiferença

Igor Ravasco

sábado, 8 de fevereiro de 2025

saudadear

saudade não é sensação,
é ação, é aperto.
saudade é deserto,
e, decerto, também oásis.
saudade não é miragem,
é imagem da realidade,
experiência concreta,
não um sentir.
então,
não sinto saudade de você,
mas te saudadeio,
e espero o dia em que fui,
ou você veio,
pra dessaudadearmos, enfim

Igor Ravasco 

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

naturezo

sou um fenômeno,
um fenômeno da natureza,
um fenômeno complexo,
um ser multicelular complexo,
não dissociado do meio ambiente.
e ao mesmo tempo que sou único,
        irrepetível,
sou parte de um todo indissociável,
sou um com o um,
        comum.
sou eco e ressonância,
conhecimento e ignorância,
sou ego, não nego...

mas me descubro rio desaguando no mar

Igor Ravasco

sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

sendo-canção

quando eu morrer,

quero reencarnar em melodia,

em música e letra,

quero tocar no rádio, 

em todas as plataformas,

quero ter forma de som.


quero ser escrito e composto, 

por alguém de santo, 

de terreiro, 

que se dedique por inteiro, 

e incorpore Gilberto Gil. 

serei canção de Gil, 

de Gilberto, 

que é mais que um mestre, 

ou poeta, 

Gilberto Passos profeta, 

o primeiro orixá do Brasil 


Igor Ravasco 




quinta-feira, 30 de janeiro de 2025

titã

cansei das metáforas,
mas das contradições
sou amigo há tempos,
dá trabalho ser apenas um,
no meio de tanta dualidade
que criamos.
e se o ser é e não é,
sou isto e aquilo,
polos complementares
que não se excluem.

        o que admiro e critico no outro
        fala mais de mim do que dele

Igor Ravasco