quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

curvilíneo

Foto: Jacqueline Hoofendy

a linha que separa
o concreto do abstrato
é fina e sinuosa,
mas uma hora termina
(talvez de forma abrupta).
o abstrato se torna concreto
e o objeto de desejo,
que nem sempre é objeto poético
nos remete a um eu sincrético,
assimétrico e ondulante
pegando jacaré numa onda do céu.

I.R.

terça-feira, 30 de dezembro de 2014

fim de ano

dizem que o ano termina amanhã.
como?
5775 começou em setembro,
e meus 39 terminam daqui a três dias.

vivemos o mundo das convenções,
da cultura dominante,
de um 2014 que termina
em um universo de bilhões de anos.

I.R.

domingo, 28 de dezembro de 2014

o amor

Foto: Raquel Bastos

o amor não tem altura,
não tem idade,
não tem distância nem cidade,
mas é a importância de ser.
o amor não é impostura,
e não impõe verdades,
o amor não tem sexo, gênero,
é mais que ser eterno ou efêmero,
não se traduz, não se interpreta,
é luz direta que não cega,
e que quando chega
entra pelos olhos
e abraça o coração.

I.R.

sábado, 27 de dezembro de 2014

Carta e Verso - 7 anos



Buenos Aires, 27 de dezembro de 2014

Prezado leitor,

se você chegou aqui, gostaria de compartilhar um parágrafo ou uma paráfrase considerando a minha falta de originalidade. Mas a originalidade é assunto para outro dia.

Sete dias da semana, sete anões, sete notas musicais, sete de setembro, sete maravilhas do mundo moderno e do antigo, sete virtudes humanas, sete virtudes divinas, sete pecados capitais, sete pragas do Egito, sete cabeças da hidra, sete chackras, as sete cores do arco íris, a casa das sete mulheres, as botas de sete léguas, fazer um bicho de sete cabeças, os sete mares, as sete colinas de roma, os sete sacramentos, a menorá e seus sete braços, as sete notas musicais, os sete livros de Harry Potter, perdoar setenta vezes sete, Carta e Verso sete anos pintando o sete.

Este é um bilhete/carta de agradecimento aos que passaram por aqui alguma vez, aos que passam sempre, aos que chegaram agora, e aos que um dia lerão, e garimpando nas coisas que escrevi chegarão a este texto.

Escrevo porque escrevo. Ou alguém se pergunta por que o coração bate? Em que me inspiro? Inspiro, expiro, respiro. Não me façam perguntas difíceis. Ou, sim, façam. Não pretendo ter uma única resposta ou espero ir mudando a mesma à medida que os anos forem passando. Escrever se trata um pouco disso, de reinvenção, redescoberta, de revolução, rebelião. Escrever em clave de ré. Ou de réu confesso.

Não sei muito bem o que significa que este blog chegue ao sétimo ano de vida. Mas gosto. Não quero chegar a lugar nenhum. Quero apenas curtir o caminho.

Um abraço a todos,

I.R. ou Igor Ravasco


sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

a lenda do cavaleiro

Foto: Ike Bittencourt

dizem aos exibidos
pra botar uma melancia no pescoço
e sair por aí.
e aos tímidos?
será que uma uma melancia
no lugar da cabeça
resolve?

I.R.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

eufemismo natalino

às vezes, não diria às vezes,
mas muitas vezes,
tenho a sensação
de que desejar feliz natal
é um eufemismo.
tiremos a máscara,
ou melhor,
raspemos a barba branca,
e digamos...
cuidado com a ressaca,
olho com a indigestão.

I.R.

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

na concertina

Foto: Luiz Alfredo Ardito

o arame de corte
que rasga e dilacera
pode ser poleiro
para quem primeiro
sabe que a espera
é o momento prévio ao bote.
sou do tempo em que a concertina
era só instrumento musical,
sou colibri preguiçoso,
cabeça-dura, tinhoso,
às vezes brisa, às vezes vendaval.

I.R.

domingo, 21 de dezembro de 2014

asa

Foto: Igor Ravasco

a asa do avião que voa
é a mesma do avião que cai...
meus céus de brigadeiro
têm mais granulado do que gostaria.
o avião está caindo,
mas a paisagem continua linda,
e uma ternura infinda
invade meu peito,
que nem sempre sabe o que é direito,
o que é certo,
mas sabe que longe ou perto
são variáveis com muitas variações.

I.R.

sábado, 20 de dezembro de 2014

ensaio sobre a irresponsabilidade

Foto: Jacqueline Hoofendy

sobrepor ideias
não é justapor conceitos,
mas saltar daqui pra lá,
ou dali pra cá
é assumir um estrabismo artístico...

distorcido na forma,
mas pleno de conteúdo
(completo em incompletude)
vivemos em um mundo de cegos,
de cegos guiando outros cegos,
e não nego que a tentação
de estender a mão
para ser guiado como ovelha,
à cerca ou ao abate,
é sempre grande.

não renego que o desejo
de guiar mesmo sem ver
sem saber que nada vejo
é um querer duradouro,
a tentação prepotente de ser pastor
que estende a mão à ovelha
como quem a leva para o curral
ou na direção do matadouro.

I.R.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

olhos e bocas

o que a boca fala
ou o que cala
é o que vela
ou o que revela.

não é de emoção
que as carpideiras choram,
no entanto choram,
enquanto se desvelam.

o que os olhos choram
nem sempre é o que dizem,
os olhos também se contradizem,
e piscam em bocas fechadas
que ainda assim comem mosquitos.

I.R.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

noite de perséiades

Foto: Leo Henry

uma, duas, três,
centenas, milhares,
milhões, trilhões
e outras palavras que não existem
para definir a quantidade de estrelas
em um universo que dizem ser infinito.
e nós, poeira cósmica,
que só podemos ser vistos
com um microscópio,
precisamos de um telescópio
para olharmos para dentro de nós.

I.R.

sábado, 13 de dezembro de 2014

pedido

Foto: Simão Salomão

uma imagem entra em outra imagem,
um reflexo, ir e vir complexo
de uma viagem ao infinito,
sem passagem, sem rito,
apenas talvez a tentativa
de estar na chuva e não se molhar.
uma imagem entre um reflexo
e o nexo que não existe,
e nem sei se existia,
porque mais do que poder,
é preciso pedir sabedoria,
e não ser um,
mas milhares de salomões.

I.R.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

desensacando

Foto: Hélvio Romero

tantas vezes me compartimentei,
quantas vezes me deixei compartimentar,
mas busco esvaziar as gavetas,
descarregar os containers,
e os sacos cheios,
e misturar o que sai,
o que cai ou o que tiro...
não sou um intelectual,
mas o trabalho manual não me dá prazer,
nem alfa nem beta,
a sensibilidade e a canalhice convivem,
nem sempre na medida certa,
e o que faço ou deixo de fazer
não tem a ver com meu gênero.
não venero tradições,
são nossas ações o que nos faz ser.

I.R.

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

enquanto sou

Foto: Vicente Sampaio

assumo minhas ansiedades,
algumas meias verdades,
reconheço minhas fraquezas,
fabrico meus fracassos
e abro meus tentáculos
como um polvo feito no ar,
volátil, volúvel,
mas indissolúvel,
como uma esquadrilha em formação.

I.R.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

jingle bells

Foto: Mark Brown

vitrines cheias de ofertas,
luzes coloridas
e árvores enfeitadas,
um senhor de roupa vermelha,
e a espera pela mesa farta,
comida e bebida de diferentes formas
de variados sabores e texturas,
guirlandas e duendes,
renas e neve nos trópicos
para não lembrarmos que a realidade
é preto e branco,
e dentro do saco, mais do que presentes
pode haver sobrevivência.

I.R.

domingo, 7 de dezembro de 2014

pandorium

Foto: Francisco Cribari

na platinela planejo
o que bato, não o que vejo
pois no pandeiro,
o que bate primeiro
não é a mão no couro,
é o coração.

I.R.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

jogatina

Foto: Marcelo Sampaio

a verdade é que a gente não só envelhece,
mas embeleza e cresce,
assim como nossos dominós
também se tornam maiores,
e nossos laços se transformam em nós,
e nossos nós, em eus e vocês.
nosso domínio sobre esse jogo
depende de nossa abertura a uma não regra
que só depende de nós escrever.

I.R.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

rua dos espíritos

Foto: Vicente Sampaio

como um espectro, caminha,
caminha e anda,
porque sabe que não pode estacionar.
fantasma urbano,
alma penada viva,
nascida do nosso abandono,
ignorada por nós, seus semelhantes,
que ensinamos às próximas gerações
que assombrações não existem.

I.R.

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

a grande explosão

Foto: Jacqueline Hoofendy

somos só uma poeira cósmica
esperando um alinhamento planetário.
mas nem só de eclipses vive o homem...
somos uma crase no meio dum texto infinito,
esperando uma supernova ou uma nova galáxia,
e sem percebermos nosso céu de lâmpadas de led
cheio de luzes estroboscópicas e lâmpadas chinesas...
nossos planetas estão amarrados num teto que terá fim.
e se algum dia a minha voz soar pelos microfones cósmicos,
será um som cômico anunciando que o leite da via láctea acabou.

I.R.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

scarface

Foto: Cynthia Dorneles

os canos que levavam água
já não funcionam mais,
são como veias sem sangue,
corpo sem vida,
ferro velho, ferida,
cicatriz na cara da natureza.

na casa das máquinas,
já não se maquinam planos
para o fim do expediente,
já não há expediente,
só restou o fim.

e ao pé dos escombros,
sob um céu nublado
um manto de um lindo dia,
a água esmeralda e fria
nos lembra que tudo passa.

I.R.